sábado, 12 de dezembro de 2009

Um dia de tarde



Um dia de tarde,
Outro que arde. Não se sabe
Como será ao anoitecer.
Contemplo minhas emoções
Faço delas paisagem
Em que serpenteiam minhas frases,
Palavras vorazes
Petrificadas em versos,
Muitas vezes tão fugazes
Quanto as inspirações.
Ser humano assim que sou
Sedenta de entendimento,
Inconformada com passatempos
Com quinquilharias, tranqueiras
Fico na beira, à espreita
À Espera de explicação.
De um entendimento integral
Onde até o mal faz sentido
E o lamento é insensatez.
Um dia de manhã,
Outro amanhã,
E outra tarde chega, com vagareza
E média tristeza
De quem quer volver
A tempos mais dóceis,
Mais amenos e fáceis,
Seja na cama, ou na infância
Ou ao nascer.

Querubim

Você é bom
Porque os anos são tenros
E a mente é ampla
E a alma é solidária
E teu tom é de risada.
Não sei porquê você é bom,
Porque te vejo assim.
Só sei que sinto em mim
O que sobressai em ti.
E é este som:
De você dizendo: Amor,
Pra mim, que sou apenas isso
Não mais que isso,
Pobre assim.
E cheia de dores, horrores,
Histórias, lágrimas, credos.
Sei que és bom porque não tivestes medo
De meus medos tão sinceros,
Tão covardes, tão dispersos,
Espalhados pelo mundo,
Por tudo, enfim.
Sei que és bom
Porque, em mera passagem,
Tivestes, ainda, visão e coragem
Palavras pra mim...
Tão fantasmagórica, performática,
Tão invisível que estava
E ainda assim...
És bom e melhor
Porque é de pouca idade
E muita fé, (apesar da dúvida)-
Como eu. - Sim...
Tu és bom. Porque és menino,
Porque és sereno, és um índio
O sílvicola de meus caminhos,
Atento ao vento que sopra
Às pétalas que se soltam
Com o tempo ruim.
És não só homem bom,
Mas pra mim, quase uma dádiva,
Uma nova estrada,
Um querubim.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Pulsos.

Como posso ser livre? Como posso ser artista? Se não houver respeito sobre minhas decisões e vontades? Sobre meus pensamentos e liberdades? Iniciativas e rumos? Amizades e amores?
Temo não poder agüentar. Pensamento fixo em pulsos. Talvez eu não resista, se o inferno recomeçar.
Tenho tanta dificuldade em tornar-me o que sou, livre e pensadora. Sem amarras. Moral. Religião definida.
Artista. De coração.
Não sei se resisto, se tudo recomeçar... Aquela discriminação e, aquele corte, que recomeçará de onde parou, sendo que já é fundo. Não estancou em mim o sangue daquelas feridas. Apenas escorre mais devagar, em gotinhas.
Mas nada garante que, de uma feita, não torne à hemorragia de antes.
Pulsos cortados.
Uma vida. Estagnada. Vazia. Porque não tem guia, nem dona. Porque segue a esmo, desvalida.
Não a suporto.
Se não há direito à escolha. Ao erro. Ou ao acerto.
Ninguém sabe os limites do outro.
Hoje já posso escrever nas paredes. Não necessariamente em vermelho.
E, talvez, materializar na carne as profundezas da alma partida, dilacerada em dores seguidas.
Penso em minha filha, apenas. De seu caule, sou as raízes.
Mas, no desespero, vejo a cena, como em cinema, em reprise.
Pulsos.
Hemorragia.
É minha vida que grita, no vermelho e no quente do sangue. E, à medida que escorre, o sumo do corpo encontra o ar e o futuro.
A liberdade. No corpo sem prumo. Na alma escorrida em hemácias, em anatomia desnecessária.
Não sei se resisto.
Mas, até no fim, insisto.
Ser como Simone de Beauvoir. Ou como uma Joana D’Arc agnóstica. Mas ser o que quero ser e sou. Sem medo, pena ou boicote.
Não sei se resisto.
Mas não posso mais mentir pra mim.
Não ser o que sou, já é o meu fim, mesmo que eu siga.
Pulsos.
Não sei se resisto.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Caixinhas de sapato



Caixinhas de sapato
Para quinquilharias,
Lembranças, cartas de amor,
Fotografias.
Caixinhas de sapato,
Guardadas no armário,
Esquecidas no fundo do sótão,
No assoalho
Adormecida com as velharias
E com o passado.
É, na memória,
A morada da madrugada
Dos dias já passados,
Das noites já dormidas,
Dos amores apagados
Pelo opaco da noite,
Que é tempo escorregadio,
Ventando com os rumores
Que restaram do que passou
E agora é vazio.
Caixinha de sapato
Debaixo das camas,
Enfiadas nas cômodas,
Nas estantes empoeiradas.
Como caixas mágicas,
Com truques e relâmpagos,
Flashes instantâneos
De nostalgia, contidos.
Caixinhas de sapato,
Para o que ficou pra trás,
Mas não pra sempre perdido.
Pra guardar o que há
De importante ou de bonito,
O que não se lembra mais,
O que é só capítulo.
Como um livro,
O filme da vida é fluido,
segue em frente,virando páginas.
E assim deve ser, ainda,
O que passou: Escondido
Numa caixa de sapatos,
Ou num “pen drive” antigo,
Pra ser um dia revisto
Redescoberto com susto,
Alegria ou alívio.
Caixinha de sapato,
Para o que é passado,
Para o que não é mais retrato
Do fato, do agora,
Do sentido.
Pra quê pendurar o passado,
Como um colar ou brinco,
Todo o tempo à mostra
Como um retrato?
Se já foi, se só é história,
Se é parte do relato
E jamais torna?
Caixinhas de sapato
Para as memórias,
Para os jornais,
Para os suspiros.

Terra tomada





Amizades disfarçadas
Ou liberdades tardias?
Não importa!
O tempo é passado.
Fecharam-se as portas,
Passagem interrompida.
Coração tomado. Repleto.
Totalmente preenchido.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Provas de amor

Não é que o sentimento não exista. Existe. Às vezes é tanto que, sendo abstrato, tem maior dimensão que qualquer algo concreto. Mas é que o sentimento é subjetivo, é indivisível. É diferente do que se faz. Do que se mostra. Do que se prova. O ato pode não ser maior que o abstrato, mas é tudo a que o outro tem acesso. É a única ponte entre o que se sente e o sujeito do sentimento. No desplante de mostrar-se ao mundo, escancarando tudo. Desavergonhado. Tolo. Maravilhado. Mostro o amor, não quando digo, mas quando toco, quando corro perigo, quando assumo, quando me posiciono, quando não mais omito, nem a você, nem ao mundo, este compromisso. Meu coração tem dono. T. Amo.






Recidiva




Não tenho medo do passado,
Nem do presente partilhado.
Tenho medo é do engano,
Do que se oculta, com artimanhas.
Do que se esquiva do real,
Abrindo as feridas.
Tenho medo da mentira
E da alma ingênua que cai
Em recidiva.
Da esperança vã,
Da ilusão ressurgida como cal,
Tomando as cores da vida,
Que parte acuada,
Farta de entrelinhas.
Tenho medo é do engano,
Do que está por baixo,
Do que é disfarce
E desfalece o brilho.
Do que não se apieda
E provoca a queda
Do coração entregue,
Outra vez partido.

Soslaio

Também quero fugir.
Às vezes é mais seguro ser infeliz.
A iminência da felicidade perdida
É quase pior que perdê-la.
E é assim que os homens fogem,
Desesperam-se, correm,
Da felicidade almejada,
Que convive agarrada
Com a ausência temida,
Com a dor repudiada.
Com o medo inimigo
Dos tempos satisfeitos,
Repletos de êxtase.
Melhor fugir e esconder-se,
Bancar o infeliz...
Encarar o sorriso
Escancarado, aberto,
É meter-se com o desconhecido,
Confiar no incerto.
É melhor correr que ser feliz.
Melhor é ficar de soslaio,
Pôr-se em fuga daqui.
Desbravar terrenos mais salgados
E que tanto não ardam
Na ausência e na partida.
E que tanto não sejam
Como dor de luto, na despedida.

Espelho




Queria não ter tanto pra escrever, ser sempre leve.
Mas tudo pra mim é vidro...
Vejo tudo através dele,
Não apenas o que está ao alcance,
Mas o que nele está contido.
É quase um dom, mas às vezes não,
Às vezes é só delírio.
Pois a imagem, quando atravessa,
Nem sempre permanece o que era.
Quase sempre quem vê ao espelho,
Vê ao inverso, ou do avesso.
Às vezes o avesso é o que mais se aproxima da realidade.
Mas, na maioria das vezes, o avesso, é só o avesso.
Nada tem de verdade.

domingo, 15 de novembro de 2009

Dedicatória

Ainda hoje prossigo assim:
Sem saber ao certo quem sou.
A única certeza que trago,
Mesmo que em embaralhados passos,
É que seja o destino qual for,
Você é dele a melhor parte,
Você sim é minha flor.
E em desérticos caminhos,
Você é meu oásis,
Meu motivo, minha cura,
Minha real ternura,
Meu verdadeiro amor.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Fruta madura


A casca é tão fina que rompe ao menor impacto ou contato extremo de calor. Tudo aqui é tão cheio! A fruta é tão densa e suculenta que não se contém dentro de fina casca. Escapa aos borbotões pelas rachaduras, que aumentam à medida que o suco escorre, com a polpa madura.
Nunca havia me imaginado fruta. Mas sou assim. Uma fruta de casca fina, como um caqui-tomate.
A pele rompe facilmente, pressionada pela polpa densa e farta, cheia de suco e doçura. A fruta madura é um instante de alguns dias. É um momento que se esvazia à medida que a pele enruga e que a doçura amarga.

Oferta e ganho




Carinho...
É esparramar os membros
E os cabelos em desalinho
Pra o contato oval
Da ponta dos dedos do outro
Deslizando de mansinho...
É entregar-se, como em sono,
À espera...
À medida que as peles se sobrepõem,
Os odores misturam-se,
E, à carícia, soma-se o calor
Das mãos turvas de ternura
Ou volúpia.
Mas também é carinho
O deslize dos dedos quentes
Percorrendo os caminhos
Da pele do outro,
Em busca dos matizes
E dos calores que emanam
Daquela outra superfície.
A diferença do carinho dado
Pra o carinho recebido
É que um, ganha-se inerte,
Enquanto se oferece a pele.
E o outro, no próprio movimento,
Que faz do carinho dado,
Um carinho que se recebe,
Mas que carece da ação,
Do movimento concatenado,
Pra sentir em si mesmo
O prazer ofertado.
Ambos são desfrutados
Simultaneamente.
Mas um se deixa aproveitar parado,
Enquanto o outro aproveita buscando
Através de deslizes, rodopios e cheiros.
Odores, suspiros e arrepios.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Outra flor




Sou flor de papel.
Desmancho fácil.
O toque da mão me amassa,
Um contato mais ágil, me rasga.
O molhado me dissolve,
O perfume me mancha,
O tempo me desgasta.
Sou flor de papel,
Um desenho a lápis.
Só é seguro, contemplar-me.
Ao tocar-me,
Corrompe minhas faces,
Dilacera minha integridade.
No papel, retratada,
Estou segura.
Em outro formato e matéria,
Eternizada.
Mas se toca e apalpa,
Examina, aspira ou aperta,
O desenho deteriora.
Deixa de ser a flor que era.
Deixa de ser, o desenho,
O papel de outrora.
E a flor muda de feição,
Ganha outra história.
Pode mesmo continuar flor
Como pode desmanchar, sem sobra.

domingo, 18 de outubro de 2009

SOLIDÃO

Minhas gargalhadas continuam. Mas a essência do meu ser volta a ser água. Sinto-me uma ilha ao avesso. Mergulhada no choro, isolada do mundo. Não acho que as coisas sejam capazes de regressar ao que eram antes desta dor. Desta solidão. Mas, se esta solidão sempre esteve aí de alguma forma, não terei eu apenas constatado a dor? Algo se quebrou em mim. Sou só. Não há como remediar esta dor. Este cristal espatifado em mil e quinhentos cacos. Colados como num quebra-cabeça, tem aparência de intactos. Mas não servem pra nada. Não suportam o movimento pinçado dos dedos e nem o conteúdo líquido dentro. Solidão. Conseqüência e causa de uma dor que não passa. Que depois de instalada, não acaba. Nunca mais.

sábado, 17 de outubro de 2009

Quero o amor de Deus

Já não quero mais namorado, Quero amores.
Tenho namorado muito
E amado tão pouco,
E tido tão pouco amor!
Quero a emoção de compartilhar,
De sentir, de entusiasmar-me,
De zelar por alguém,
De querer bem.
Só quero o que é bom.
Quero o amor.
O amor de Deus.
Não quero o amor dos homens.
Não mais quero o compromisso,
A dor, a cobrança,
A ilusão da fidelidade.
Quero só a sinceridade
Do sentimento dividido,
Compartilhado,
Cultivado com cuidado
E afinco.
Quero quem me é querido.
E dele não quero nada mais
Que o comprimento que tomam
Os acontecimentos seguidos.

Banho de Sol "Giovana"

Linda mulher...
Foi assim que a vi,
Desde o primeiro dia.
Assustou-me tanta beleza,
Olhos tão verdes,
Cabelos longos ao vento,
Naquela onda típica das modelos.
Loira e de corpo perfeito.
Quem não se assustaria?
Mas o que me assustou mais,
Convívio adentro,
Foi a astúcia, a graça,
A leveza, a doçura,
O saber ser palhaça,
A inteligência,
O dom pras artes,
As diferenças...
De tudo o que por aí havia,
De tudo o que era comum.
Giovana não sabe de novela,
Nem comentar propaganda,
Faustão, então, nem pensar!...
(Às vezes faz falta um Shrek..., É verdade!),
Mas esta loira é assim:
Você olha e fica a pensar o que há
De errado com ela, ou contigo.
Tipo de mulher completa,
De mulher daquelas que faltam
Pra dar orgulho pra gente,
Que é mulher e quer ser
Tudo o que uma mulher pode ser .
Giovana é assim: tudo!
E também esta coca-cola toda!
- Deus nos ajude, pobres mortais!,
Apresentar namorado pra esta aí,
Dói até o pâncreas! -
Porque mulher reconhece
Uma bela espécime
E logo levanta as orelhas,
Antenada pra concorrência,
(Que aí, está claro: é imensa!)
Mas quando se conhece este ser,
Cheio de tanta virtude,
Um bichinho começa a roer
Dentro da gente.
A mesmice de sempre, o rotulado,
O que é tido como típico,
O que todo mundo faz
E é ordinário,
Começa a ruir.
Giovana é modelo de mulher,
Dessas que a gente quer ser,
Linda, inteligente, determinada,
Um pouco brava também,
Que afinal também é de carne!
Dói em minh’alma só em pensar
Não ter na minha vida todo dia
Sua piada, sua sagacidade, sua luz
Pra tudo clarear!
Mesmo no breu, mesmo na dificuldade,
Todo dia, com ela, o alvará
É pra banho de sol.
Banho de Sol "Giovana".

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

AGRADECIMENTO

A meus pais:
Por tudo o que me deram:
Suas vidas, ou mais...
A energia que os movimenta
Para o trabalho, para o dia-a-dia,
Para o sonho e a magia
 Do amanhã em toda manhã.
A meus pais, por esta casa.
Como poderia a mim, estar aqui,
Em meu lar, minha morada,
Sem o auxílio de meu lar primeiro,
De minha original, casa?
Obrigada,
Por toda ajuda até aqui!
Por, de minha filha cuidáreis
Como se de vós fosse saída.
Obrigada, queridos,
Pelos dias suados,
Pelas noites em claro,
Desde que nasci.
Obrigada pelos estudos,
Pelos agrados,
Pelos quitutes preparados
Com amor sem igual.
Obrigada, meus anjos terrenos!
Vocês, sim, verdadeiros,
Na retaguarda de meus passos
Certeiros ou em falso.
Mas, de tudo o que me deram,
(Apesar de incomensurável valor,
O amor dedicado),
Incontestável alegria,
Dão-me estas paredes!
Erguidas em volta de mim,
Guardam-me e libertam-me!
Real presente de amor!
Sem vós, muito eu demoraria
A alcançá-las...
Obrigada, minha família!
Meus pais amados, que, um dia,
Saberão o quanto sou grata!
Logo terei, de idade,
Os trinta e três anos de Cristo:
Este amigo querido e divino,
Que vos destes a mim como pais
E a vós, eu, como filha.
Conduzido é, meu coração,
Na vossa companhia e proteção.
São meus guias!
No vosso exemplo, persisto.
Jamais me entrego, ou desisto.
À vossa sombra, abandono-me,
E meu compromisso é em honra
Do sacrifício de vossas vidas.
Obrigada!

Defeitos do que penso

Tudo terminou quando eu parti e não deixei de bagagem a saudade a quem eu deixava. O sonho do sonho perfeito acabava aos bocados, à medida que a distância aumentava, entre o que eu havia sonhado e o que se realizava. À medida em que diminuía a estrada que me reconduzia ao meu mundo. Há mistérios tão profundos que não são vistos. E sensações tão planas que se julga impossível não desvendá-las. Mas tudo é tão complexo! Às vezes nem o mistério é tanto que não possa ser explicado, nem a sensação é tão verdadeira quanto nítida. Mas como segregar os defeitos? Dos maus julgamentos, que instintivamente fazemos, e das doces ilusões que, inutilmente, plantamos? No céu de minhas nuvens havia anjos. Ruivos nos cabelos e castanhos nas tez curtidas. Mas nas nuvens não há castelos nem príncipes. Como segregar os defeitos que sempre existem no que queremos ou no que julgamos? Como ser menos humanos e não confundir os medos ou os desejos com os passos dados e os segundos passando, contando recados? Terá ruído o castelo ou finalmente se revelado o engano? Anjos não são vermelhos. Seus cabelos anelados refletem o dourado e suas mãos hábeis manipulam não a percussão, mas a harpa. Será este um julgamento? Ou um momento? Uma ilusão pelo medo desenhada? Como segregar os defeitos, as armadilhas da própria charada?

Quem inspira minhas lágrimas sou eu.

Os pingos molhados caídos
Foram por ti, apenas inspirados.
Porque as gotas foram derramadas
Em vazão dos sentimentos sortidos,
Há muito represados.
Quando choro ou sorrio,
Em silêncio ou balbúrdia
É sempre um assovio.
Um ar soprado de dentro
Numa tentativa de música.
Sempre há nele um motivo,
Um tema, um título,
Mas sou sempre eu:
Assim mesmo, ou reescrita.
Às vezes cantada,
Às vezes derretida
Em salgadas lágrimas
Ou saliva.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Miragem de reencontro


Procuro minha cara-metade
Sob o sol que irradia,
Sob a lua que emociona,
Seja tempestade
Ou bonanza.
Numa fantasia, deposito
As expectativas.
Pra não definhar a alegria
A magia do romance,
A miragem da alma reencontrada
De sua outra parte perdida.

Noite acesa

Mesmo que o dia tenha suas fases,
Persiste em mim a alma de menina,
Em sua maior parte.
E, na cidade,
Arde menos o desejo,
À medida que o escuro parte.
Feixes de luz branca invadem
Os cômodos acordados
Sob as lâmpadas e abajures.
E o romance é só um detalhe,
No âmago da claridade.
Pois as sombras dos amantes
Acovardam-se,
Iluminadas no dia que não termina
Nem com a noite,
Nem com a agonia.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A quatro mãos


É engraçado receber a noite,
promete fantasia, descanso, calmaria.
Mas é solitária, é silenciosa, é fria.
A noite que é amiga, que é minha, que é lua...
Que noite boa, seja a sua!

Melhor é receber o dia e suas promessas.
É abrir os olhos, inaugurando o capítulo...
Possibilidades mil com ele amanhecem,
Despertando a esperança.
 Bom dia!

(Dan e Lari)

domingo, 20 de setembro de 2009

SULZER


Se é verdade que o nome colabora na definição da pessoa, então, está esclarecido porque este nome, rejeitado por mim no dia-a-dia, foi-me dado. Meu pai era filho de colonos em uma fazenda de donos suíços. Cresceu em meio a Marias e Josés e, as suíças, donas da fazenda - ou filhas dos donos -, deviam ser típicas suíças: altas, loiras, de nomes estranhos, como o meu: Súlzer.
Então, ao encontrar um recorte de revista com este nome, talvez mergulhado na fantasia que as moças ricas e bonitas despertavam, meu pai guardou o recorte com o nome para uma possível filha, que, à época, ele ainda não sabia: seria eu.
O nome na verdade, é um sobrenome. Mas, como se sabe, os sobrenomes, quando se referem à autoria, vêm na frente, separados por vírgula. Mas ele não atentou para isso: e assim foi que um sobrenome tornou-se meu primeiro nome. E um sobrenome suíço, muito forte, com aparência de judaico, no qual teorizo um fonema semelhante à pronúncia de pizza.
E aqui estou, tal qual as suiças: alta, relativamente loira, e com corpo de européia. Nada de ancas fartas como as brasileiras, ou cinturinha fina, (infelizmente). Meu número no exterior seria 12. Aqui, não tenho número definido, nenhuma roupa brasileira é pensada pra um corpo como o meu. Sou atípica. Da aparência ao que não aparece. E também de temperamento quase europeu. Mais introvertida. E de piadas só com verdadeiros amigos.
Sulzer. É também o nome de um asteróide que, por incrível coincidência, foi descoberto um dia depois do meu aniversário: 12 de outubro, só que em 1990. Como ele, sou meio espacial também. Quem me conhece sabe de quantas viagens siderais sou capaz!
SULZER é ainda o nome de um filósofo. E esta sim é uma influência que me agrada, pois, se um nome atrai para a pessoa uma característica sobressalente, então, JOHANN GEORG SULZER, influenciou-me grandemente. Sou filósofa. Não de profissão, mas por hobby. Adoro pensar a vida, debater a vida, esmiuçar problemas. E, principalmente, ter muito tempo pra nada fazer e poder dar ao pensamento tempo para elaborar suas teorias.
E JOHANN GEORG SULZER teorizou muita coisa e foi um filósofo brilhante! Um filósofo alemão pra uma brasileira de estrutura alemã... e que, quando criança, sonhava com telhados de casas alemãs, como as de Blumenau.

 

Sei que não chego nem aos pés de Johann. Mas tenho o seu sobrenome como nome. E isto é muito forte. No tempo em que eu fazia cursinho, num lugar que nem existe mais hoje em Santo André, (o Universitário), o professor de redação, uma vez deu-me um tema em que não correspondi ao que ele queria - o que era raro. O tema era: “O belo é bom, mas o bom é naturalmente belo”. Filosófica... Era uma teoria de alguém, que hoje descobri ser o filósofo JOHANN GEORG SULZER. Mais um sinal de que Johann influenciou-me vida afora, sem que eu soubesse. Contudo, sua influência numerológica não abrangeu tudo o que acabei tornando-me, por minha própria vontade e burilamento. E, sendo o que quis tornar-me, e o que o mundo tornou-me, - nem sempre com o meu consentimento -, resultei num ser que, ou não concorda com a teoria de Johann, ou não a compreende o bastante. Não desenvolvi bem a temática, estendi-me demais na argumentação. Mesmo assim e, talvez, por isso, ela ficou gravada pra sempre em mim.
Hoje, não uso mais meu primeiro nome: Súlzer. Apresento-me pelo segundo nome e sou Larissa ou Lari, ou La, pra quem amo. Bastam os tempos de escola, em que o professor fazia questão de não pronunciar corretamente Súlzer, para perguntar-me a pronúncia, sempre soletrando, fazendo questão de envergonhar-me, salientando sua estranheza e estrangeirismo . Não sabiam eles, nem eu, o que este nome me traria. E, apesar de, ainda hoje, não gostar de ouvi-lo quando me chamam, não abro mão do meu diferencial. Do meu primeiro sobrenome-nome, europeu e espacial que tanto revela de mim. Odiei-o demais já. E com isto talvez tenha perdido muito do que ele me trouxe. Hoje, nesta recuperação do que sou, quero ser TUDO o que sou e fui, inclusive Súlzer.

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A locomotiva

 

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O escritor

C’est l'écrivain suisse de langue allemande ALAIN CLAUDE SULZER qui a remporté le prix Médicis du domaine étranger avec «Un garçon parfait» Ce roman, qui traite de l'homosexualité à travers l'histoire d'un amour impossible entre deux garçons, dans les années 1930, est le premier de cet auteur à être traduit en français.

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O asteróide

16505 Sulzer Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. Sulzer Número 16505 Data da descoberta 12 de Outubro de 1990 Categoria Cintura principal Características orbitais Perélio 2,7625789 UA Afélio 3,2222249 UA Excentricidade 0,0768022 Período orbital 1 890,71 d (5,18 a) Velocidade orbital 17,21800345 km/s Inclinação 10,65473º Sulzer (asteróide 16505) é um asteróide da cintura principal, a 2,7625789 UA. Possui uma excentricidade de 0,0768022 e um período orbital de 1 890,71 dias (5,18 anos). Sulzer tem uma velocidade orbital média de 17,21800345 km/s e uma inclinação de 10,65473º. Este asteróide foi descoberto em 12 de Outubro de 1990 por Freimut Börngen, Lutz Schmadel.

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O filósofo

JOHANN GEORG SULZER, autor da importante enciclopédia das belasartes, Allgemeine Theorie der Schönen Künste (Teoria Geral das Belas Artes, 1777), por outro lado, considera a Laune em uma acepção mais próxima da visão germânica, como uma disposição de espírito (“Gemüthsfassung”), um estado afetivo (“leidenschaftlicher Zustand”). No verbete “Laune”, ele aproxima os conceitos Laune e humor, e afirma que: “Laune é exatamente aquilo que comumente se expressa com a palavra francesa humeur, ou seja, uma disposição passageira [Gemüthsfassung] na qual uma emoção, agradável ou triste, é tão dominante que todas as idéias e expressões da alma são por ela contagiadas. Ela é um estado afetivo [leidenschaftlichen Zustand] no qual a paixão não é intensa, nem tem um objeto determinado; simplesmente, seu conteúdo agradável ou desagradável espalha-se por toda a alma. Em uma Laune alegre vemos tudo pelo lado prazeroso, numa triste, no entanto, é tudo triste. (...) O juízo não é totalmente tolhido pela Laune, como [é tolhido] por uma afecção violenta, mas é distorcido, pois não vê nenhum objeto em sua forma verdadeira, ou em sua proporção correta. (...) Freqüentemente, o artista não tem outra musa para auxiliá-lo que sua Laune. (...) Aquilo que nós vemos em sua forma verdadeira e com suas cores naturais, o homem humorista [launig] vê de forma alterada e com cor falsificada. Espanta-nos que ele não veja as coisas como nós as vemos, e por isso, o estado humorista (launig) se aproxima do ridículo, e serve para nos alegrar.
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A biblioteca

Conrad Sulzer Regional Library is one of two regional libraries in the Chicago Public Library system in Chicago. It was named for Conrad Sulzer, the first non-native settler in Lakeview. Lakeview is now a neighborhood in Chicago. The library is located in the Lincoln Square neighborhood at 4455 N. Lincoln Ave. It is a full service library and ADA compliant. As with all libraries in the Chicago Public Library system, it has free wi-fi internet service.



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A multinacional

http://www.swisscam.com.br/sulzer-brasil.html

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O certo e o errado



O certo e o errado. São fixos. Dois pilares. Ninguém pode saber se optar por um ou por outro é o que trará a felicidade, mas todo mundo sabe o que é certo, e o que é errado. É a voz da consciência. É um senso comum, mas, principalmente, superior às circunstâncias do humano. É a regra de conduta que, acima das justificativas inerentes a cada escolha do homem, estirpa o bem do mal. Bem e mal que, como o certo e o errado, são fixos. Não se movimentam de acordo com as circunstâncias, com os poréns de cada um, com os motivos subjetivos de cada ser, que opta pelo sim ou pelo não. Por isso, o que é certo e o que é errado, não depende de prisma. É estático e universal. O que se movimenta são as peculiaridades. Cada qual tem seus motivos, suas justificativas, seu passado, contribuinte ou cúmplice da escolha que fez. E estes fatores não deturpam o certo e o errado, apenas os humanizam. Os tornam passíveis de senãos e por causas capazes de conferir ao certo e ao errado uma aparência de simbiose, que os fazem assemelhar-se ao ser sujeito a esta consciência universal. O certo e o errado são a voz de Deus na consciência do homem. São perfeitos, intactos. Mas, à medida em que se tornam parte do homem, que opta por um deles e se justifica com sua própria história, com o meio em que está imerso, com os sentimentos inexplicáveis que nele se misturam, tomam a feição do homem e se tornam, aparentemente, passíveis de ponderação. Mas não são. O que é certo, é certo. O que é errado, é errado. E, apesar das circunstâncias que poderiam justificá-los, continuam basilares. As justificativas são apenas circunstâncias oriundas da cultura, dos costumes. Da vida humana e de suas confusões e misturas. Mas, por mais fortes que sejam, são apenas a voz do homem pretendendo, em descabido argumento e frágil escusa, abafar a voz de Deus.

Somos todos inocentes

Todos têm seus argumentos,
Seus motivos,
Seus lamentos.
Todos têm
Um porquê,
Um mas, um além de.
Todos têm uma dor,
Um medo,
Uma falta.
Um trauma passado,
Uma marca.
Todos têm
Uma mãe que falha
E uma infância amarga
Em algum estágio de criança.
Assim, todos têm
Motivos pra ser fracos, ou,
Sendo fortes,
Pra atemorizar.
No fundo é assim,
Todo homem é
Um poço de detalhes
Propensos a justificar.
Somos todos inocentes Com nossas imperfeições,
Reticências
E itinerantes carências.
Todos somos humanos,
Passíveis de erro,
De engano.
Somos todos inocentes
E parte de um plano
Que inclui erros e acertos,
Travessões, acentos,
Laterais, próprios
Ou anexos.
Todos têm seus acontecimentos
A justificar o lamento,
O desvio,
O nascimento.
Todos têm seu enduro
Pra atravessar.
E destes momentos é que vêm
As circunstâncias possíveis
De nos inocentar.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Teclas

Escrevo apertado demais para canetas grossas. Gosto das Bics. Mas, para ser sincera, há tempos me machuco com todas. Aperto demais entre os dedos, e no papel. E dói. Falta de hábito. Hoje em dia, escrevo mais teclando. Como a maioria no mundo. Mas continuo achando mais charmoso escrever à mão. Porque a letra também revela a emoção. Às vezes as idéias vêm tão lépidas, que a letra treme, garrancheia. Pra que não se perca o miolo, a essência do poema, do pensamento. Adoro preencher um caderno inteirinho. Sem pular uma folha sequer, sem deixar um espacinho em branco. Preenchendo tudo com palavras. Com letras, de preferência, perfeitas. Batendo em ambos os paralelos da linha, como num caderno de caligrafia. Da mesma forma, gosto de gastar as canetas até o fim. Sinto prazer em ver uma caneta que cumpriu totalmente a sua missão. Escrevendo até que nenhuma gota de tinta sobrasse inútil. A carga vazia. Hoje, eu preferiria um caderno de folhas brancas e largas. Fáceis de manusear e de preencher fartamente. Mas escrever à mão dói ainda mais.

Terceiro Olho



Um terceiro olho, pra ver além das aparências. Um teste pr’um mundo que, cada vez mais, se oculta, sob as vestes, sob as frases, sob a pressa. Mas, e se, com ele, se pudesse adentrar no obscuro? Proteger-se dos falsos sorrisos, do auto-marketing promíscuo? O que seria de nós? O que veríamos? Bocas carcomidas, desdentadas, fartas de chagas, por causa do veneno das palavras, carregadas de mal e inveja? Corpos sofridos, envelhecidos, enegrecidos de fumaça e cachaça? Carcaças ocas, desleixadas, enfraquecidas pela falta de emprego dos músculos e membros? Cérebro diminuído, em tamanho e funções, porque não organiza, não processa, não limpa o que contempla e o que deixa de contemplar? Terceiro olho pra quê? Deixe como está.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Brumas vermelhas



Horizonte de deserto:
Brumas vermelhas.
Paisagem sibilante,
Quase uma miragem,
Sobe a poeira.
É a terra esturricada que transpira
Em moléculas aéreas.
A vista é entorpecida
Pelo ar denso.
Nenhuma folha é mexida
E nenhuma outra cor cintila.
Reina o vermelho.
De olhar, à distância, já é quente.
O sol estende-se pelo chão,
Concretamente,
Num terreno rubro-intenso.
Paira a cor vermelha
Do céu à terra.
A alegoria do inferno, a cor, desenha.
Mas os personagens são caboclos
E a música-tema
É o assobio do ar que não venta
E da vida que não se movimenta,
Apesar do suor que pinga
E da criança que lamenta.
Sobe a poeira
E sob ela há insistência
Dos dentes no sorriso do caboclo,
Querendo ser brancos,
Sob as brumas da poeira vermelha.
Sobe, sem cessar, a terra,
E sua cor é poeira.
Tinge a pele morena,
Enrugada pelo sol,
A espuma da água que lava
A roupa pesada do labor,
A lágrima que rola, grossa de pó,
E como miragem, desfaz-se,
Reincorpora-se na cor,
Torna à paisagem encoberta
De vermelho e calor.

domingo, 23 de agosto de 2009

Mulher comum

Quero o direito de ser uma mulher comum. Uma mulher comumente nobre. Como as de antigamente. Uma mulher que às vezes não está com as unhas pintadas, nem perfeitamente depilada. Uma mulher que cozinha, cuida da casa e sua, fazendo as tarefas do dia-a-dia. Uma mulher que se cansa, que fica exausta. E que, ao sentir-se assim, tem linhas embaixo dos olhos baixos. Quero o direito de ficar com os cabelos desalinhados, ao estar em casa, com meus afazeres. De vestir meus pijamas mais confortáveis, minhas roupas de ficar em casa. Quero o direito de estar pálida, de mostrar os olhos pequeninos, sem máscaras nos cílios, como um esquilo. Quero o direito de ser uma mulher comum. E ainda assim, ser amada. Ser desejada. Onde estarão os homens que desejam mulheres de verdade? Aquelas que podem ser esplendorosas, mas também extremamente simples, batalhadoras? Onde estarão os homens que desejam uma mulher de avental, lavando as louças do almoço? Ou com os cabelos displicentemente presos, enquanto corta os legumes, preparando a comida? Onde estarão os homens que admiram uma mulher cansada, uma mulher exausta pela lida, pelo esforço de tudo que reúne sob seu comando? Onde estarão os homens que se encantam com uma mulher que se lambuza ao comer melancia e que ri como uma criança, às vezes sem motivo? As mulheres valorizadas, são as de capa de revista. São impecáveis. São portanto, as imóveis, as estátuas, as que “se cuidam” e, talvez, não cuidem de mais ninguém além de si mesmas. É importante e bom olhar no espelho e ser e sentir-se bela. Mas ainda melhor é sentir valor e amor em ser várias. Em desempenhar vários papéis, dentro de inusitados figurinos e, ainda assim, ou mais assim, ter valor. Sentir o desejo real de seu homem que a quer principalmente quando ela cuida, além de si, dos outros, dele, do mundo. E se permitir estar de cabelos desgrenhados e unhas descascadas, naquele instante de entrega. Em que, apesar de tudo, ela ainda é ela.

A alma está gasta

Cansam-me as aventuras.
Gastam-me.
Meus sonhos, minhas carícias, meus instantes.
Não quero gastar-me com aventuras.
Minha alma cansa-se.
Não quer ser gasta.
Não quer ser alvo de carências, de toques ameaçados de remorso e dúvidas.
Recolho-me.
Com meus cacos e dissabores.
Minhas metas e sonhos.
Até que o “mundo” clareie.
E com ele tudo o que me rodeia.
Falta a alma, em mim
E não posso gastá-la,
Para que não se acabe o ar
Ou brilhe a navalha
Mais que a lembrança dos sorrisos
E dos familiares.
Recolho-me das aventuras,
Do mundo e de seus horrores,
Até que tudo clareie
E possa, eu, ver amores,
Sorrisos, doçuras,
Cheirosas flores.

AXÉ




Horas solitárias e doloridas. Lágrimas. Lágrimas amigas que desanuviam meu peito e liberam meu ser para sensações outras, que não esta dor sem causa. Às vezes choro. Pela manhã, quando me troco. Quando me dispo de minhas vestes e me toco. A pele fria. Às vezes choro e o choro é fundo. É só uma dor. Sem explicação. Sem motivo remoto. São lágrimas desesperadas, desconectadas do real, abismadas no vazio. Lágrimas salvadoras. Irrompem, com suas gotas, a dor bloqueada, as dores rotas, amassadas, sufocadas pela razão. Porque neste país e nestes tempos, é fora de moda ser infeliz. Axé para os brasileiros! E, no pensamento do cidadão, a teoria de “O Segredo”. É fora de moda ser triste. A maioria das emoções não mais existe. Qualquer que seja o estado de espírito, a alegria impera, sob o som do AXÉ, o torpor das “ervas”, a distração dos churrascos com cerveja. Antes podíamos ser tristes. Cantar a dor, transpor os limites do agradável. Hoje ninguém mais resiste. Tudo deve ser editado. Nossos intelectuais afastam-se, apavorados. O lema é a positividade, a risada. O “amasso”, a música animada. Ninguém mais canta o desencanto. O desalento. A tristeza. O questionamento. A dor. O buraco de ser humano. De ser pensante. Até os intelectuais sorriem. Até a boemia é “pra cima”. O que houve com o Romantismo e os poetas das antigas? A que se reduziu o homem com seu sorriso implacável, permanente, e seus mil e quinhentos amigos? É mal cantar a tristeza, o mal, a avareza, o egoísmo, a corrupção? É mal incomodar-se num país como o Brasil? Em que o que mais vale é sorrir, à imagem da perfeição, com axé geral nas rádios.Quero todos os nuances. Ser imperfeita.

Abre-se o céu

Abre-se o céu.
O céu volta a abrir-se pra mim.
Posso vislumbrar o azul com o alaranjado. As nuvens são brancas e fofas, com várias caras.
As nuvens, cinzas, afastam-se, perdem força.
O vento sopra vagarosamente, (em cada minuto, um dia), para longe, a tempestade.
O tempo sopra, aos bocados, o cinza das condensadas nuvens. Das nuvens carregadas de tristeza, que se afastam.
Vejo o céu abrindo-se. Raios de sol atravessando e irradiando o planeta de cores, com sua luz verdadeira.
Abre-se o céu.
Novamente, abre-se pra mim.
E, abrindo-se, nele percebo possibilidades antes, mais que improváveis, impossíveis.
Percebo que se estendem para mim as escolhas, (meu eterno dilema), à medida que o vento sopra e as cores primárias interagem, abrindo o céu dos meus sonhos, que antes parecia haver morrido.
Abre-se o céu. Um buraco azul na folha cinza, carregada de nuvens. Nuvens de água. Água de lágrimas salgadas.
Abre-se o céu. E nele há amores.
Nele há cores e passos antes nunca dados, nunca ousados.
E, no azul com o laranja, o que há?
Esperança.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Fidelidade

O que é a fidelidade? Não sei bem se ela pode existir, mesmo nas relações mais honestas. Teimo até em dizer que não. Nem nas relações mais puras. Porque a fidelidade não é a lealdade. A lealdade é a virtude de ser pelo outro, de maneira que este outro possa contar contigo nos momentos mais improváveis. A fidelidade não. É muito mais que isso. A meu ver, é, nas relações amorosas, a expectativa de só desejar o parceiro, apesar das circunstâncias. Portanto, não existe. Porque não é uma atitude. Está no pensamento. E o pensamento, imaterial como é, é volátil demais para ser fiel. Por isso, a maioria dos casais, pra não dizer todos eles, mesmo os que propagam a crença na fidelidade, reduzem a característica da fidelidade ao aspecto material, apenas ao que se faz, e, ouso dizer mais, apenas ao que se vê. Mas não que isso seja errado. Se de alguma forma deve existir a fidelidade, que seja na única forma possível, ou seja, nas atitudes. E, como as atitudes nada mais são do que o que se presencia, que seja a fidelidade a característica do que é visto. Isso porque, como já disse, o pensamento voa, e não há quem não deseje um outro corpo, outro sabor, ou simplesmente a individualidade, a independência em seu mais alto grau, que só a solidão é capaz de proporcionar. Mesmo que por alguns instantes, mesmo que em breve devaneio, logo contido pela razão, pela moral, pela “lealdade” ao outro ou pelo bem querer, que repele os atos impensados ou inconseqüentes capazes de magoar quem se ama. Fidelidade não tem relação com o amor. O amor existe. Também ele é o que se constrói, o palpável, a atitude. Mas este é, além disso, uma emoção, uma ternura inquestionável, soberana dentro das relações, permeador dos “mistérios” da vida. O amor é abrangente, capaz de envolver muitas coisas e pessoas e ele é, por sua complexidade, capaz de coexistir com a maioria dos sentimentos: a raiva, o ciúme, a inveja, a admiração, a paz, a paixão, a complacência, a misericórdia, a dependência, a carência... A fidelidade não. A fidelidade é um ideal. É o ingrediente dos contos de fada, é a segurança do perfeito, do acabado, do completo. Mas o amor não é assim. A vida não é assim. O universo é o movimento. E o movimento jamais é completo, está sempre em transformação, distante do perfeito, porque não se sabe o resultado quando tudo gira o tempo todo e a magia está na transmudação, no novo. Por isso, sou pelo respeito. Pelo bem querer. Pela consideração ao parceiro, que não necessariamente deve ter acesso a todos os compartimentos de sua alma ou a todos os caminhos do seu pensamento, que, às vezes viaja por outras praias e delineia outros corpos e bocas, com a imaginação.



Fidelidade é uma meta, inalcançável nas relações de casal. E creio que até nas relações entre amigos. Porque mesmo os amigos mais queridos falham, e despertam no outro a queixa, o vislumbre daqueles defeitos, às vezes não ditos, pelo amor, este sim, maior, protetor. Ser fiel é para o ser humano, um distanciamento de si mesmo. Respeitar, não. Respeitar é reconhecer as limitações do movimento da vida e de sua característica falha, posto que humana. É considerar que, como a areia que muda de lugar, um pensamento libertino ou apaixonado, às vezes dura o tempo de um raio, e não merece ser dividido. Respeitar é saber que o outro, como o eu, tem seus “flashes”, seus repentes, seus segredos, e que, apesar de haver em nós sempre a tentativa da claridade a todo custo, o obscuro é elemento indispensável da convivência. Nem tudo deve ser partilhado. Porque, o soberano, é o amor. E o amor deve sobressair a tudo. Até à fidelidade. Que é a utopia dos casais apaixonados, impossível de perdurar, a não ser no que se mostra, no que, cuidadosamente se revela, com carinho e cadência, a quem se ama ou quer bem.