segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Preciso escrever todas as coisas
......Ainda que seja impossível
......Ainda que todas as coisas
....Não caibam na minha escrita
..........É pra isso que eu tanto
.......................SINTO.
Não me prender a crença nenhuma
: um modo de não duvidar de nada.
...
Somos pequenos demais
(esse entendimento me basta).

Espécime raro

Um espécime raro
Perfeito
Ereto, calmo
Por dentro
Tem a cabeça coberta por um turbante
(cabeça feita)
E o império da razão sobre o sentimento
...
Vê a vida através dos óculos
(vê melhor)
E o sorriso bem aberto
(às vezes sem som)
Autossuficiente/supra-humano
Não compreende pequenos dilemas
(sofrimentos vãos)
...
Esta noite anda sobre o trilho
Mas não é padrão
Prefere flutuar entre os mundos
Navegar ondas
Invisíveis
Sempre adornado por um lenço
Que o cobre qual manto sagrado
...
Todas as cores caem-lhe bem
(nele, todas as roupas casam
ainda que nenhum tom as aproxime)
Está acima dos demais
É rei esquecido
Em caminhos ordinários
(desapegado das coisas da carne)
...
Faz a viagem
Sem misturar-se
Pra continuar leve
Não impregnar
Nem impregnar-se
Desta vida.
aprecio a leveza
(ela aroma)
...
mas o que me sustenta
não voa
...
tem peso.
às vezes a gente tem medo
(o medo pode ser um presságio
um instinto de proteção)
mas se o abandono te abraça
o medo vira quase nada
: prefere-se qualquer coisa
à escuridão dos tempos
em que nada acontece.
sensação dúbia
: o que sobra
: o que falta
e o quadro inclinado na parede espiando a sua dúvida
sua vontade de surpreender-se com a vida
esta coisa incrível, que bem se sabe
surpreende apenas quando quer.

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

não, eu não aguento muito
não tenho todo este tempo
tenho urgência de felicidade

aguentar não está no enredo
quero aproveitar o tempo
e viver o auge

mergulhar fundo, buscar o ápice
fazer dos grandes números
meus melhores anos
o seu maior defeito
e o meu também
é sua maior qualidade
a de todos nós

será este o indecifrável enigma
dos amores findos
dos aromas inebriantes
que o ar impregnam ?

quem vai saber
se a evolução de si
não é o fim
de nós?

Os cabelos dela

Ela andava por aí
Os cabelos imóveis
Nem o vento, nem a chuva os tiravam do lugar
Cabelos afro...
Mas as ideias SEM FRONTEIRAS
Navegavam como areia
E às vezes paravam numa duna,
Às vezes num deserto
Às vezes, numa ampulheta
Mas mesmo assim, qual o tempo
Andavam
Escorriam constantemente
Como aqueles dedos que um dia
Perderam-se nas entrâncias
Dos seus cabelos negros.

pipa de Cutrale

Um pipa de cutrale à frente do carro
placa de Bebedouro
destino não se sabe
você pensa e fala de vontade
de sugar o suco de laranja
de canudinho
pssssssss
por que vc viaja?
já não sabe que o estômago não aguenta?
essa azia companheira não perdoa
por muito menos te atormenta
quem te aguenta neste congestionamento
lenga-lenga até São Sebastião
quem diria que dois de janeiro
a gente pegava um trânsito desses?
já não basta esta garoa na Serra
nestes dias pós- reveillon
ahh! que importa se o céu se cobre
ou se o chão molha
em janeiro, no Brasil, é verão
e lá vamos nós outra vez
mata atlântica nas bordas
e trópicos no tempo.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

rangendo os dentes

Tenho escutado você ranger os dentes na madrugada
Você não dorme como antes
...
Inveja-me o sono das crianças
De braços abertos pro universo dos sonhos
Sem um pestanejar
Mas você não dorme como antes, coração
Você range os dentes
E o barulho deles cerrando uns nos outros
Me desperta, me faz pensar
Nos barulhos lá fora
Na manhã seguinte
No medo de morrer, adoecer ou ficar louca
No medo de ficar só
De estar só
Por quê?
Você, coração, range os dentes no meu peito
E eu te escuto e penso
Quero voltar pra casa
E aqui estou:
Novamente acordada.

o amanhecer

eu jamais poderia fazer o que faço no escuro
eu jamais poderia usar a noite, como uso o dia
eu preciso da luz do amanhecer
ver renascer a vida
todo novo dia

é bom quando amanhece
quando apesar de tudo, o sol nasce outra vez
pra se acreditar de novo
ter esperança de novo
ler, escrever, cantar
sonhos

essa luz, sabe
que vem do sol
deixa as coisas coloridas
a noite no passado
vê-se o mal de outro prisma.
amanhecer, em si já é uma alegria.

e ao mesmo tempo, a brisa nova que nasce
oferece uma folha em branco, limpinha
- ah se eu pudesse viver só esse dia hoje
e nada viesse escurecer minha vida
a não ser a noite.
escrever deslizando...

moda que deturpa até a escrita em si
quem escreve tropeça, não desliza
quem escreve encasqueta
com o fonema que a letra desperta
enrosca no sentido
embrenha na tacitura da rima.
quem escreve queria
levar a vida na boa
mas delira na estrofe imagética
vê personagens na esquina.
embebeda-se no boteco mais perto
só pra trombar com o complexo
e ter assunto pra uma linha
ou um soneto.

quem escreve não desliza - quem dera!
A vida é muito grave e sisuda
Leva as pessoas às vezes
E ainda cobra obrigadas, sorrisos.

Comigo não, ingrata!!
Morro de raiva
Praguejo cada lágrima, enfureço.

Não tenho etiquetas
Nem boa política
Em despedidas

Se te finges de besta
Insulto em N línguas
Blasfemo

De nada me valem justificativas
Frases feitas.
Não acredito.

vamu junto

vamu junto!
você pensa que é fácil, mas não
: às vezes é preciso apertar o passo
às vezes é preciso perder a pressa
às vezes o tempo do outro acelera
às vezes se perde o seu tempo

vamu junto, colega!
quase um dilema
nessa dança em que o ritmo alterna
e o piso sacoleja
é difícil acertar o passo
encaixar o momento

vamu junto! ele disse um dia
e a ela o convite soava
como coisa nova, moderna
mas não!
o mesmo desafio de sempre
com letra menos brega

vamu junto!
como é difícil
dar a mão, o braço, o mundo
pra que outro siga consigo
num passo compassado
num sonho dividido

vamu junto, meu amigo
pega esse atalho
no exato instante
em que se laça a fita
de encantos casados
e vida vivida.

não sei mais falar de amor

falar de amor
eu não sei mais
não sei mais o que é
em quantos se divide
e se é ainda aquele de antes
inadiável
improrrogável
intransferível

não sei mais dessas coisas
porque o amor
essa água que cai de um cascalho alto sobre os ombros
(com a força de uma torrente de água
em cachoeira véu de noiva incrustada em montanha virgem)
pode ser tantos...

eu sabia dele
podia identificá-lo com o corpo
com a alma
com o gosto
com a tara

hoje não
só escrevo o amor
que amor? - duvido
que amor? divido.

aquele amor que toca à distância
inebria os sentidos
e alcança
ainda que ausente de palavras
ainda que ausente inteiramente
se foi com as certeza do ontem
é só fuligem

mas existem outros
cheios de medo, de dedos
vazios de devastação
: irreconhecíveis.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

preciso de ti

eu te quero
e é um querer tão intenso
que preciso.

não que eu não sobreviva sem ti
sobrevivo
apesar de todas as coisas perdidas, sobrevivo.

posso viver sem ti
como posso viver sem quase nada
é por amor à vida, e mais nada, que se vive.

ainda assim, preciso de ti
mesmo que não seja verdade que preciso
somente um querer muito intenso que se estende e multiplica.

mas que um dia
um dia longe
esvanece.
enquanto você estava calado era como se você não tivesse existido
não como se estivesse morto
mas simplesmente como se nunca tivesse havido você, e o que eu lembrasse fosse inteiramente imaginação ou sonho

continue calado
eu prefiro
eu prefiro escolher um por um os capítulos e abstrair de ti a voz e qualquer trejeito que não condigam com o que eu quero lembrar
prefiro o pensamento
o efeito do tempo que age e cobre as coisas com filtros Instagram: amarelo de foto antiga, plácido preto e branco ou cores vivamente impossíveis

continue calado e deixe aos meus ouvidos a música que lhes interesse ouvir
aos meus olhos, os olhos em que desejem incidir
à minha memória, o formato sem oco da sua presença fictícia

continue calado e quieto
e deixe que meu coração ame o que não existe
o que nunca talvez tenha sido outra coisa senão um perfume, uma sombra, uma dúvida perdida entre as frases, uma vírgula que se omite entre os versos.
é muito mais simples:
eu não sinto falta de uma pessoa, de um nome
eu sinto falta de um tempo.
Não é todo dia que para na rede um peixão daqueles
Se a vida surpreende com boa notícia
Pessoa rara, um achado, um tesouro
A gente aproveita, beija, ri, anuncia.

A gente aprecia que o mundo ouça
Dance em valsa antiga conosco
Faça, em ritmo, coreografias, malabarismos
(como alegres golfinhos).

Não é todo dia que a vida dá de presente- não é todo dia.
Quando chega, portanto, o dia
A gente respira bem fundo, respira
Pra guardar nos pulmões, na corrente sanguínea
Coisa mais valiosa, invisível, mística
Jóia mais rara e cara, mais linda:
O amor.
há quem só sinta o amor que sente
mais nenhum
eu, contudo, posso sentir o amor de fora
o amor de alguém/ninguém que vem
em direção
...
é um tumulto!
mistura-se no meu, o amor do mundo
e já não sei
se é, ou não, prudente
ouvir o coração.
eu chorei chorei chorei
do outro lado da cidade se ouvia
mas ele não ouviu.
era o fim
...
hoje, ia passar por mim
mas eu o olhei nos olhos
: estou com medo, eu não disse
mas ele viu
deslizou seu dedo pela minha face
e seguiu sonho adentro
sem mim.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

sei viver não

eu não sei viver não
só rastejar em chão de amor
meditar
querer o amor
respirar
sonhar com o Nepal
as tribos indígenas
as águas turvas
do rio divino
um dia sereno
a paz (cadê?)

ir em frente sem medo
decifrar o segredo
(quem vai?)
e dizer-me como
viver
como vive quem
sabe viver

espero você que não vem
que vai, que sai
se deixa
e eu não sei se fico
ou se parto
se estou, sou [lunática]
bato asas sobre montanhas
(montanhas sem cume
ou escalas)

quero entender
saber viver
com a certeza de um réptil
nas areias do deserto
de um leão faminto no inverno
entre arbustos secos, intragáveis
(à mostra o esqueleto)
...
vem você que sabe, diz:
onde aprendo? [ensina]

L.G.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Amar sem amor

Me ensina um novo jeito de amar
Um jeito de amar sem amar
Sem tocar
Sem tecer.
Um jeito de amar "en passant"
Um jeito de amar sem sofrer

Me ensina a amar sem marcar
A amar sem querer
A amar sem estar.
Sem pensar
No amanhã
No por quê

Ensina um jeito de amar como deus
Como flor.
Um jeito de amar-montanha
Areia.
Um jeito de amar
Borboleta.

Me ensina um jeito de amar sem choro
Sem mão dada, pé na estrada
Sem antenas.
Sem pegadas
Sem migalhas
Tormentas.

Ensina-me a amar sem amar
A amar como manda a revista
A amar sem nada que prenda
(Sem sonho, sem isca
Âncora
Pista).

E então vou te amar sem falta
Nem flauta
: como um peixe, uma lesma.
(Não como gato ou cão
Que se entristecem
Com a perda).

Te amar sem amor
Nem lenda.

sábado, 26 de julho de 2014

amor aerado parece
que perde a força, perece
e a prece ronda 
em vento, a boca
até que o eu te amo 
em silêncio
padece.

Dias noturnos

Tem dias que te amo
Dias noturnos
Cheios de oceano
Negro e profundo.
Dias imensos
Em que me atropelo
E sonho esquecer
Este amor vez em quando
Que faz que me abandona
Mas só engana.





quem ama quem

vc não me ama
eu também não amo você
que é que tem
a gente pode começar um jeito novo de amar 
movido pelo desejo 
de não amar um ao outro
em momento algum

eu não te amo
você tão menos me ama
não tem importância
vamos assim desta vez
pra ver se o desamor morre amor
e a gente, afinal
sobrevive ao fim

eu não te amo
nem tão pouco me amas também
você que já amou tantas
e eu que jurei ser a única
de alguns eternos amores
que o tempo levou

o que é que tem

a gente muda de ideia toda hora
portanto, pode ser
que amanhã a gente seja unha e carne
corações grudados
como em desenho na árvore

vamos neste novo jeito
(amar sem amor)
jurando jamais dar vazão
às loucuras do coração
pra ver se, por fim
a gente muda o bordão

(infelizes para sempre).

LG

domingo, 20 de julho de 2014

melodia mínima

nessa melodia mínima
é impossível cravar versos de peso
impossível criar nesse compasso repetido
em que o som vai-e-vém em curto espaço.
minhas queixas não acham brecha
nem estacionam, devaneios.
ficam no ar, como poeira

no ar, no ar.

como ideias que não saem da cabeça
ou amores que só existem no papel.

eu quero um caminho extenso
pra andar meus desejos
desenhar pensamentos
enlouquecidos e sibilantes como o vento.

estica essa frase musical um pouco mais
pra eu caber dos pés à cabeça
e não tenha que me esconder como uma lesma
imiscuir-me qual inseto indefeso.

L.G.

o amor

o amor pega a gente de fininho
(não ouve a razão)

amor, a gente sente quando deita abraçado
e quando respira junto.
quando o sabor da boca do outro
saliva na boca da gente

o amor é um troço de louco
: tanto faz feliz como triste
tanto é motivo pra vida
quanto pra buscar a saída

amor, então, quando parte
mata matado uma parte
não por um tempo apenas
mas pra sempre

(só quem já perdeu um amor sabe
o tamanho do corte
só quem chorou o fim pode
compreender essa morte).

um amor às vezes não fica
às vezes não tem coragem
outras vezes até repica
mas, então, usa disfarce

ainda assim tenho dito
: É AMOR
e nenhuma outra palavra que o vista
retira-lhe significado.

L .G .

se eu não escrevo a minha dor

se eu não escrevo a minha dor
ela me corrói
e minhas forças se moem
como sementes de trigo
num moinho de vento.
moo a mim mesma
trecho por trecho
e acabo por ser
o retrato de um semblante que era meu
numa moldura de gesso

se eu não escrevo a minha dor
enlouqueço - sinto
esmoreço - deixo
(perco o eixo e a eira
sou toda dor
toda noite
escura e erma.

um beco solitário
uma cabeça de gado
na parede do rancho sobre a mesa.
o silêncio completo
de uma encruzilhada
numa fila de pinheiros).

se não escrevo, pelo menos
pra pintar minhas lágrimas de palavras
e minhas tristezas de beleza
sinto como se já não fosse eu
: tudo em volta, delírio
sendo real só o dentro
(com seu universo disperso
entre o fim de tudo, e o começo).

sinto como se o dia
jamais fosse nascer outra vez
e o coração não batesse
: pele gelada de serpente sobre minha pele
e abismo sobre meus pés
numa descida de bicicleta

e então respiro o ar gélido das ruas de antigamente
e me ofereço ao vento

:vê, pai! sem as mãos!

L . G .

brilha a lua

brilha a lua
(não sei se nova
não sei se cheia)

brilha branca
romântica
muda

quanto mais alta
mais uivam
cães e corações

bela lua
(!) como é lúdica
como ilude

lua lua lua
dos sertanejos
dos astronautas

dos cabeleireiros
mulheres grávidas
(...)

dos enamorados

brilha
bela, única
(no manto da noite).

L.G.

domingo, 6 de julho de 2014

a partida
parte-se em duas
: a porta que se fecha
a estrada que se abre.
e é um descampado nu, selvagem
os corredores gramados e extensos
as árvores enfileiradas na beira
e bichos pequenos escondendo
do sol implacável.
o silêncio...
delicado silêncio da natureza
a cantar nos ouvidos uma brisa
um piado
...
aquele vento
...
que só em um coração partido cabe.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Residência de amor

Estou cheia de amor
Todos os compartimentos e fendas
Todas as arestas e portas
Toda insistência e desistência
Que carrego e suporto
Por amor, com amor.
Respiro e colho
Com mãos suaves e sujas de terra
O amor que brota e infesta
Todos os cômodos
Toda minha residência.

como esquecer

pensa que se esquecer é assim?

esquecer é pra poucos
é para os que sabem sorver gotículas de vinho do Porto
degustar uma iguaria

esquecer não é coisa que se faça com demasiado ímpeto
não é como morder uma maçã inteira
nem gargalhada repentina

esquecer é delicado
é suave
diário

é pra quem tem real coragem
- não pra quem se põe correr à deriva
disfarçando o pavor.

oração

dormir uma noite completa
eu agradeço
porque se desenha depois dela
dia manso
coração sereno
quem sabe até uma chuva leve
pra alimentar a represa
ou um presente dos céus
em forma de gente.
eu sinto
e creio
que Desse lugar vem aconchego
pra tais passos, tropeços
em detalhes pequenos que se amontoam com delicadeza ao redor
e mini grandes surpresas
que me socorrem
como uma dádiva Maior.
agradeço.

acordar entre flores

vou fingir que não é comigo
fechar os olhos, fazer uma prece e pensar em coisa qualquer que me leve
daqui pro infinito
pra um lugar sem nomes
cicatrizes.
vou fingir ser outra
ter outra vida
e acordar entre flores
lírios , tulipas.
quando sinto você, sinto nos ouvidos
um balanço de rede
zumbindo.
mas se pretendo esquecer
finjo não entender
invento ser outra
e me largo na brisa
de um tempo sem ontem, sem amanhã.

palavras pra quê

as palavras
todas servem
todas querem
dizer
algumas mentir
outras urrar

as palavras
não são feias
as palavras não são feitas
de proibido
: é permitido
expressar

pra o que quer que seja
estão lá
dispersas no tempo
ou na garganta
no cérebro
ou na lembrança

uso palavras
sem pensar
uso palavras
com pesar
uso palavras pra morder
palavras pra beijar

há palavras de morrer
palavras de matar
palavras pra criar
palavras pra descer
o pau
(palavras de baixo calão)

mas são as palavras hipócritas
o verdadeiro palavrão
não importa que se diga bosta
ou coisa ainda mais suja
a mentira e o engano, sim
são vocabulário chulo.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Corpo aberto

Se você tem o corpo aberto
Deve saber
Às vezes é melhor ficar quieto
Em silêncio
Às vezes é preciso fechar as portas
Passar concreto
Nas rachaduras
E ficar
Consigo mesmo e mais ninguém
À espreita
De interferência nenhuma.

Mas será possível?
Se o outro me atravessa
Me alcançam, seus pensamentos
Se sua língua me lambe as orelhas
De palavras meigas.
Saliva doce
Em minha boca seca
Enlaça-me o pescoço
De desejo.
Tira-me, o ar
Por longe que esteja.

terça-feira, 17 de junho de 2014

antimovimento
...
uma tarde de praia
sob sol de inverno
não se ouvem as ondas
nem nada aqui dentro
não importa
...
carros rodam lá fora
como sempre.
ainda bem que há lágrimas
quando os sentimentos já não tem onde se assentar
elas liberam uma vaga
uma cadeira vazia
pra sentar, ver o tempo
...

L.G.

silêncio

silêncio
: não é falta de assunto
é vaga em tarde quente
ar parado no tempo
um dia de dezembro
sem nada que fazer

esse silêncio
pode até ser triste
mórbido, escuro
pode ser punk rock
ou um moribundo
arrastando seus farrapos pelas ruas

silêncio que arde
que invade
sela as paredes da alma
e germina sem água
como sementes de cactus
no deserto nordestino

silêncio mudo
silêncio amigo
das pedras, dos rios, da pescaria
dos amigos de verdade
dos beijos iminentes
da morte, quem sabe

não tem palavra
não tem barulho
também sem lágrima
sem urro
sem o tumulto da incerteza
do desejo, o submundo

silêncio, me beija
deita comigo
depois penetra minhas valas
lava minhas falhas
e me faz parte sua, um resquício
qualquer de paz.

L.G.

terça-feira, 13 de maio de 2014

edição ilimitada

abro os olhos:
lá vem tudo
e é perfeito, único
novo.
este dia
apesar de outro
apesar do mesmo
apesar do mundo
é um filho entre outros filhos
(de temperamento exclusivo)
um quadro branco
um fosso profundo
de água limpa.
este dia que nasce hoje
não existe outro:
aproveite, sue, esqueça,
ouça com o espírito
e como a música

edite.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

o amanhecer é uma alegria

eu jamais poderia fazer o que faço no escuro
eu jamais poderia usar a noite, como uso o dia
eu preciso da luz do amanhecer
ver renascer a vida
todo novo dia

é bom quando amanhece
quando apesar de tudo, o sol nasce outra vez
pra se acreditar de novo
ter esperança de novo
ler, escrever, cantar
sonhos

essa luz, sabe
que vem do sol
deixa as coisas coloridas
a noite no passado
vê-se o mal de outro prisma.
amanhecer em si só, já é uma alegria.

e ao mesmo tempo, a brisa nova que nasce
oferece uma folha em branco, limpinha
- ah se eu pudesse viver só esse dia hoje
e nada viesse escurecer minha vida
a não ser a noite.

Vida, vida...

A vida...
ah
eu não sei porque ela é assim, tão difícil
ao mesmo tempo em que é tão bela
que estamos tão agarrados nela
e que não a podemos deixar por nada
ela nos faz coisas cruéis
nos cobra , nos testa
nos mata
sometimes.
Às vezes a gente acorda e pensa
que, afinal, vem a recompensa
mas esta, muitas vezes
é a vida em si mesma
com tudo o que ela traz
: os tantos dilemas
as injustiças e maus julgamentos
a incerteza
de que o dia de amanhã será melhor
de que o amor realmente virá
e ao estar, não irá partir.
Ainda assim, a esperança
- a própria vida -
ressurge num novo dia
pela manhã bem cedo
(olhos entreabertos
mente povoada de sonhos quase vivos
:coloridos e mornos)
e teima em dar chance a ELA
sim, uma vez mais.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Amor novo

Vêm sobre mim
seus personagens
:mocinho, bandido,
palhaço,
galã apaixonado
bêbado sem cura.
E invadem-me a boca
seus gostos
- tantos variados -
de doçura e loucura,
de luxúria e cigarro.
Este lugar proibido
vaza em esquinas
do imaginário,
as bordas do coração.
Deito-me num chão
de terra,
sem vestes, sem passos.
A rua anda por nossa pele,
a lua anoitece-nos
o brilho dos olhos
: chama inflamável à paixão.
Atrás dos
muros,
nos degraus do
mundo
a esperança e a desilusão
no mesmo patamar.
Uma senhora desce os óculos pra ver bem
o amor novo que nasce sem
de ninguém ter permissão.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

filme indecente

É bom ficar pensando
Em silêncio
Aroma de morango
Na língua, na vagina

Viajar na lembrança
Da tua boca na minha
Como quem bebe um Porto
Traga um absinto

E sentir-me embrigada
Tonta, louca, rendida
Querer um quarto vazio
Um cômodo inteirinho

Pra desembrulhar um por um
E em paz, cada beijo
Todo o veneno
De nossos corpos unidos

Ver outra vez desenrolar
A tua pele sobre a minha
Em cada ato, sem corte.

E reviver este amor
De emoção e carne,
Como um filme.

domingo, 13 de abril de 2014

homenagem

vou escrever um poema pra você
mas nunca vai estar à sua altura
ainda que eu seja mais alta
e nossos versos tenham a mesma espessura
você será sempre Bessa
e eu sempre nessa
procura.

L.G.

From now

Quando começar a andar na minha direção
Deixe suas canetas onde estão, sua escrivaninha
Traga apenas a paleta de cores e os pincéis
Talvez o lápis HB
E aquela réplica de Picasso
Que remete a seu gato esgueirando pelos cômodos
Traçando um andar malicioso pelo piso
Enquanto trança seu corpo esguio e fofo
Entre suas trêmulas pernas.

Traga o vidro daquela pimenta italiana
E seu livro de receitas da República Tcheca.
Traga também seu travesseiro
- Ninguém dorme direito com os pensamentos deitados sobre travesseiro alheio.

Quando começar a andar
Reúna todos os panos e retalhos
De roupas suas, desfeitas -
Talvez aquelas de quando ainda era criança ou não tinha este apetite pelo negro das trevas na vestimenta
- e guarde.
Quando for a hora
Vamos coser aquela linda colcha pro inverno em Praga
Em seguida dos passos de Kafka
Relembrando os dias em que não éramos
O que decidimos nos tornar 'from now'.

Quando estiver vindo, apare a barba
Escolha finalmente uma cor vibrante
E simplesmente vista, simplesmente sinta-se
Num olhar colorido e intenso
Como o sol atrás dos montes
Da linda praia brasileira de Itamambuca, num janeiro qualquer.

Lá, empreste-me seu chapéu de abas pra eu evitar as sardas.
Acho lindo e exótico esse seu chapéu,
Parecido talvez com aquele uruguaio
Que eu não trouxe de Montevidéu, das férias de outubro passado
Depois de uma semana árdua e quente na argentina Buenos Aires.

Quando você estiver a caminho
Esqueça as fotografias.
Deixe também seus livros
- o jejum às vezes ajuda a assimilar melhor os nutrientes da próxima refeição.
(Sou uma pessoa de muita fome
E muita pele.
Talvez por isso escreva
Talvez por isso queira tantos lugares na lembrança
E tenha tanta gente na ponta da língua.
Talvez por isso carregue
Tanto fardo nas costas
E coração sob a sombra dos versos.)

Mas venha
Vamos pelas ruas de Cuba
Ou à procura de Titicaca
Depois de uns dias em La Paz
Até alcançar o cume
No Império Inca
Onde aquelas mantas coloridas
E sua mão na minha
Irão tirar o grisalho dos versos que te conduzem mundo afora
E deixar, em lugar, o assovio suave e selvagem
De um indígena escalando o horizonte
Enquanto caminha a cordilheira dos Andes.

Lári G.




sexta-feira, 11 de abril de 2014

Vez em quando

Tem dias que te amo
Dias noturnos
Cheios de oceano
Negro e profundo.
Dias imensos
Em que me atropelo
E sonho esquecer
Este amor vez em quando.
Que faz que me abandona
Mas só engana.


L.G.

two poets

I like to be your simple home
with the sun smiling on my roof
I like to be just a painting
or a dream
while the life walks without us

I never could be so perfect
than I am with the ocean before me.
I never could be so beautiful
and you never couldn't be so gentle
if didn't exist this poetic distance
separating our bodies

but I like that I can to be
finally, something easy
I like to think that I can be soft
like a cloud or a butterfly
fliting trough the trees

I know that everything we live
now, is like a gift or a sound
coming from behind the mountains
or hidden in the wild forest

At last, who could resist
the brilliance
that survives
in passionate eyes,
and to heat inside the heart
of two poets?





L. G.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Não pode

Como pode que às vezes eu ame
Só às vezes
E outras vezes despreze
Abomine, ignore
Pense

Como pode que às vezes eu clame
Por ti, indefesa?
Que às vezes eu queira sua pele
Sua incandescência
Indecente

Como pode
Meu anjo-demônio
Esta surpresa a cada instante
Nada/nunca
O mesmo

Como pode, meu amor
Depois de haver tirado minha paz e certeza
E feito de mim um tapete
Que ainda eu queira
Às vezes

O sabor da tua língua
A tua veia na minha
A tua teia???

I'm enough

I don't need anyone
I can survive without you
I'm okey now and from here I know
Nothing can take my peace if I don't permit

Listen what I'm saying in your ears
I'm enough for my hapiness
I'm enough for me

While the train cross places that I never saw
My thoughts sail without me
Without water or anything

While you cry without me
I follow without anything
I follow with myself only
That it's all I need

I don't remember yesterday seeings
I don't belong to the past
I don't belong to you
And nothing and anyone belong to me

Listen what I say in your ears now
I'm enough
It's just the necessary
I'm enough for my hapiness
I'm enough for me.

andar perdido

o coração
em nova canção
dobrar esquinas
de não se sabe onde
e ver horizontes
nunca vistos antes
talvez nunca depois

andar por aí
livre livre
no desconhecido
sem domínio
nem ilusão
de saber o caminho

andar no estrangeiro
como um estrangeiro
olhando tudo pela primeira vez
tudo talvez
não se sabe
pela última vez

as comidas
os cheiros
os rostos
os sons
tudo muito raro
sem comparação

andar por ruas estreitas
por largas avenidas
por sinuosas vielas
por pontes sombrias
sem saber nome nenhum
nem qual estação

andar perdido
pra quem sabe acontecer
o destino.

luz azul

tão lindo é ver
sorver
com pálpebras molhadas
o néctar do mundo

miúdo, no entanto
o tempo gasto
o encanto

parece que é necessário mais

mais tempo na estrada
mais palavras

parece que é necessário o outro

que ficou do outro lado do oceano

parece não ser necessário nada

menos euros e flys
menos malas

apesar do belo
emerge da perfeição sinistra
o ferro

algo de indigesto
no império
da nação sobre a criatura

do patrimônio (uma grandeza sem tamanho)
sobre o ser humano

são muitos caminhos
muitos sentidos
e uma língua única
dita de maneiras várias

é lindo, mas um tanto triste
que uns vivam sobre ouro
enquanto outros sequer comam

é bom andar pelas ruas
a qualquer hora sem medo
mas será possível
se de onde eu venho
não é possível?

vem cidade luz
cheia de estrelas, monumentos
vem
me deixa imergir neste sonho
algum tempo

me deixa respirar este ar
sofrer outras dores

só algum tempo

(do outro lado da rua
um indiano
demonstra seu produto
atirando para o alto
luz portátil azul).

L.G.



amanhã

Hoje
Tantas dificuldades
Lágrimas
Pranto
Hoje
O desencanto
A desesperança
A desilusão
Hoje
O desespero
O desDeus
O apelo soando sozinho na escuridão

Amanhã
O amanhã.

L.G.

ausência

talvez eu volte a escrever em papel
talvez eu volte a ser quem eu era
quem sabe, meu bem, eu consiga
ignorar o trajeto, as músicas deste novo tempo
e tornar-me outra
ou a mesma. Quem sabe?
tantas vezes ele quis ir
tantas vezes o medo ficar
e a preguiça de enfrentar
de viver
quantas vezes sem fim
veio e deitou-se na soleira da porta
vestida do pesadelo
de sentir-se só???

quem me vê falar acredita que eu tenho medo
que eu temo ser só

não conhece a verdade desta alma eremita e livre
independente e só



apesar disto, tenho, sim, medo
mas ele faz parte de ser inteira
indivisível

meu Deus olhe pra mim
ponha seus olhos sobre este velho caderno
e rédeas neste temperamento diabólico que Te enfrenta
e questiona a Tua vontade
a Tua existência
e ainda teme o que é tão menor

a ausência
só a ausência.

L.G.

Praga do Tim

Ando de gol 2005
Preto
No meu rádio toca 89.1
Rock
Moro na mesma vila desde que nasci
Quase nem parece a mesma
Prefiro bijuteria à jóia
As maiores

Não ligo pra marca de roupa
Nem conheço modelo de carro
Tenho dificuldade com nome de rua
E minha memória não é das melhores
Minha ambição é pouca
E de tanto cantar
Quero amor sincero, eu só quero amar
O Universo me deixou o amor
Como único patrimônio.

L. G.

Em Paris

Um homem defecando no meio da rua
Sem calças, nu abaixo da cintura
Não se agacha, facilita estar a meio corpo
Sequer olha para o lado, seu lugar é a rua
Não há banheiro pra turistas, que dirá para esses tipos
Enoja os passantes, os leitores
Primeiro aquele espanto, depois o horror de encarar
As fezes de outro a desbundar
O deslumbre de Paris
Com seus prédios médios de janelas grandes da Belle Epóque
Retrato da opulência e arrogância
Disfarçadas na elegância
De Paris
...
Sim, ela é linda
Ela brilha como ouro aos olhos do sonhador
Sim, vê-se a Torre a milhas
Há pontes, há o Sena, a Monalisa
Mas alguém tinha que fazer esse serviço
Cagar na cara do turista, do parisiense, desta Europa rica
E devolver um pouco da bosta toda que ela espalha pelos continentes
Há séculos e séculos atrás
E continua
...
Tem gente sobrevivendo do comércio de bugigangas em Paris
Gente morando nos buracos esquálidos dos metrôs de Paris
Urina pelas escadas, quantas escadas, do metrô repudioso de Paris
...
Ainda que se acendam mil luzes
E que se veja a Torre a mil milhas
Nada apaga esse ar rude
Que não considera necessidades primárias
Que iguala o homem mais glamuroso e perfumado
Ao mais pobre e coitado
...
Aquele homem e sua bunda suja
E o excremento que a todos enoja
Mas que sai de dentro do corpo humano
De todos, humano
...
Aquele homem e sua coragem
E sua loucura e sua vontade
Manchando a honra da Cidade Luz
O perfume francês da Champs-Elyssés

Não me sai da memória.

L.G

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

pra mim carnaval não significa nada

escuto os barulhos lá de fora
que sorte
estou viva
caminhões sobem minha rua
e eu perdida
no meio da estrada

ouço o som das letras que rimam
no corpo das palavras
pode ser ilusão este verso
este fim
meus ouvidos encontrando música
na branquidão de uma prosa

pode ser ilusão o batuque
deste carnaval

pra mim
carnaval
não significa nada

só ressoa na noite
sem coração nehum

estou cansada
tão cansada
tão contida
vou bater as asas
sobre o mar
as colinas
uma andorinha.

L.G.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Sem vento

Longe de todos vocês
Seus monstros
O que me importam essas noites, esses sons
Não me importam
Daqui um minuto fecho os olhos e lá se vão
Os sonhos
A andar por si mesmos
Absortos
Se ao menos ventasse esta noite
Se ao menos,o vento
Viesse cantar no meu leito
Pra me adormecer.

Simplesmente bonito

Passo por passo
Vou trilhando o caminho
No meu compasso
Tictic dum
Dumdum tic tac
Passo por passo
Nesta estrada sozinha
O sol na testa
O mal me testa
No braço de ferro
...
Eu nem ligo
Tic dim dum Dum
Dabdab dum
Pensar me deixa exausta
Não me importa o que é difícil
Gosto do que é bonito
Simplesmente bonito
Como um quadro de Van Gogh
Uma criança dormindo
O mar formando praia
O barco virando nada
No infinito.
Dabdab du
Dub Dub
Dab dab

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

a mariposa

essa mariposa
bate as asas escuras e se esconde
entre as angústias e ruas sem luz do meu espírito

(perdoem-me as cores da sua borboleta
a sua esperança
as suas asas delicadas!)

a mariposa desses versos
disfarça-se nas agruras deste corredor sem saída
nos ângulos deste labirinto

:de cor cinza
feia e desajeitada
a mariposa esconde-se em qualquer frestinha

enfrenta a noite
não tem medo da floresta
nem de tempestade

essa mariposa que eu guardo
e que incomoda os teus olhos
e que blasfema os teus lábios

essa mariposa sim
não tem medo
da verdade

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Ressurreição

Tô escutando pra ouvir
Nada me diz
O sonho desfeito

Mas os passarinhos
Os carros
As pessoas que passam

Me falam
: da vida
De ti

Do dia que inicia
Da noite que passou
Do amor que ressuscita.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Ode ao avesso

Pra você é muito simples
Enclausurar-se todo dia
Pra ganhar dignamente a vida
Pra você não há sofrimento
São as necessidades
A sobrevivência

Então você levanta e vai
Se veste e penteia
É da sua natureza

Eu me queixo e você não compreende
Repreende meu lamento
Diz que eu fantasio
Cabeça de artista vagabundo
Pensamentos à deriva
"Como vai comprar o carro
Pagar o condomínio?"

Você não entende que o mundo é minha casa
E os muros são antíteses
Às rimas fáceis das minhas frases
Às minhas dúbias alegrias

Você não entende por que caminhos minha vontade vai
E que nada de ordinário me apetece
: todo dia acordar, bater ponto e tomar
O mesmo ônibus pro serviço

Queixar do chefe,
Domar a alma livre
Comportá-la num compartimento
Tão pequeno pros meus olhos
Sedentos de mundos, pontes, rios

Você não pode ver
Você não entende
Só pensa na prestação da casa
Na grama do vizinho
(Sempre mais verde
Sempre mais lisa)

Só espera o jantar de domingo
Só se ocupa com idiossincrasias
- tão natural à burguesia -
(Essa classe que atende a conclamos e regras
Mas pouco vive)

Você não entende meu raciocínio
- pra mim isso é um alívio -
Ser compreendida por alguém assim
Seria suspeito e ambíguo

Só me compreendem os surfistas
Os poetas, peregrinos
Só me compreendem os artistas
Os sem-tetos, os indígenas.

L.G.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Mais um janeiro.

Alguns dias apenas.
Isso não machuca, deixa penetrar...
Só algum tempo sem angústias
:Andar e volver um outro lugar não fere, não aluga.
Só uns dias. Só uma vida.
Só esta estaca, só esta estada.
Alguns dias, algum tempo infinito.
Interstício no pensamento
- obstáculo na oclusão.
Só uns dias. Mais um clima.
Somente um chão, um vão,
um janeiro a mais.
Um passo, um regato, um adeus
um pôr-do-sol, um bem-te-vi.

Paixão do demônio.

Paixão parece doença
Num click, remete a um paraíso
Que se desvanece ao se formar

Mas quem pode vencê-la?
Perdem-se as estribeiras
Enlouquece-se o pensar

Um demônio sem dono
Castigando a vontade
Escravizando o corpo (delírio)

Uma obsessão sem juízo
Calvário de sonhos, delícias
Cujo destino não raro

É o abismo.