Quando começar a andar na minha direção
Deixe suas canetas onde estão, sua escrivaninha
Traga apenas a paleta de cores e os pincéis
Talvez o lápis HB
E aquela réplica de Picasso
Que remete a seu gato esgueirando pelos cômodos
Traçando um andar malicioso pelo piso
Enquanto trança seu corpo esguio e fofo
Entre suas trêmulas pernas.
Traga o vidro daquela pimenta italiana
E seu livro de receitas da República Tcheca.
Traga também seu travesseiro
- Ninguém dorme direito com os pensamentos deitados sobre travesseiro alheio.
Quando começar a andar
Reúna todos os panos e retalhos
De roupas suas, desfeitas -
Talvez aquelas de quando ainda era criança ou não tinha este apetite pelo negro das trevas na vestimenta
- e guarde.
Quando for a hora
Vamos coser aquela linda colcha pro inverno em Praga
Em seguida dos passos de Kafka
Relembrando os dias em que não éramos
O que decidimos nos tornar 'from now'.
Quando estiver vindo, apare a barba
Escolha finalmente uma cor vibrante
E simplesmente vista, simplesmente sinta-se
Num olhar colorido e intenso
Como o sol atrás dos montes
Da linda praia brasileira de Itamambuca, num janeiro qualquer.
Lá, empreste-me seu chapéu de abas pra eu evitar as sardas.
Acho lindo e exótico esse seu chapéu,
Parecido talvez com aquele uruguaio
Que eu não trouxe de Montevidéu, das férias de outubro passado
Depois de uma semana árdua e quente na argentina Buenos Aires.
Quando você estiver a caminho
Esqueça as fotografias.
Deixe também seus livros
- o jejum às vezes ajuda a assimilar melhor os nutrientes da próxima refeição.
(Sou uma pessoa de muita fome
E muita pele.
Talvez por isso escreva
Talvez por isso queira tantos lugares na lembrança
E tenha tanta gente na ponta da língua.
Talvez por isso carregue
Tanto fardo nas costas
E coração sob a sombra dos versos.)
Mas venha
Vamos pelas ruas de Cuba
Ou à procura de Titicaca
Depois de uns dias em La Paz
Até alcançar o cume
No Império Inca
Onde aquelas mantas coloridas
E sua mão na minha
Irão tirar o grisalho dos versos que te conduzem mundo afora
E deixar, em lugar, o assovio suave e selvagem
De um indígena escalando o horizonte
Enquanto caminha a cordilheira dos Andes.
Lári G.
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