quinta-feira, 25 de agosto de 2011

PESSOAS QUE SALTITAM


Têm pessoas que não vão
Perambulam de cá pra lá, de lá pra cá
Saltitando
Às vezes, só sombras brincalhonas
Sobre nossos passos
Mas seus traços preenchem lacunas
Ficam gestos e perfumes
Assuntos
A doçura profunda não se esvai com o tempo
Fica pro infinito
Às vezes numa cor azul
De olhos ou de águas
Outras em retratos
Eternizados na memória
Loucuras pequeninas
Cenários grandiosos
Entregas impossíveis que deságuam
Almas vulneráveis que se jogam
À vontade de não esquecer
Nem serem esquecidas
Deixam-se perpetuamente
Entre as coisas temporárias
Que ficam

domingo, 21 de agosto de 2011

TRATADO SOBRE A TRISTEZA


A tristeza é minha amiga e não se aparta por muito tempo. É uma companhia itinerante, que quando menos é provável, me visita, carregada da velha bagagem de sempre.Hospeda-se comigo, sem alarido, e sua estada me é familiar e serena. E até que ela se vá, eu me dedico a consolá-la somente.
Não tenho queixas a respeito dela. Ela não me trai jamais. Estar com ela é passear um pouco na madrugada, sem saudade do dia. É deixar-se existir sem a expectativa dos sorrisos ou do júbilo.
Encostar-me um pouco no fundo, recarrega minhas baterias. Quando vejo as coisas do alto, minha percepção é dúbia e me ilude. O que a tristeza tem de mais bonito é que ela não me derruba. E estar com ela sem alarde, me faz mais forte e mais capaz de seguir sem medo. Afinal, quem tem na tristeza uma amiga, não tem o que temer.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Era de amar


Uma cerveja
Lascas de queijo
Segredos contidos
Desejos-medos pelo ar

Viver é preciso
Deixar-se levar
Crer no sentido
Do obscuro

É enduro
A corrida da vida
A tentativa de algo mais

Outra cerveja
Pensamentos tão tenros
Como a novidade
De acreditar

Que o amor pode estar
Num curto momento 
E no surto lascivo
De se eternizar

É do futuro
O tempo perdido
Na era de amar

sábado, 13 de agosto de 2011

COLCHA PRO INFINITO

Cinza sua
Matéria crua sobre mim
Só ternura
Suas mãos puídas de alecrim
E tem no ar
Terra a planar
Qual passarozim
E pra encerrar
Flores de paz
Pra você seguir
Cinza sua
Colcha de rusgas
Pro infinito
A doçura é
Jardim de olores  tão sutis
E volto já
Pr’esse lugar
Perto de ti
E pra encerrar
Estrela a brilhar
Em cores mil
Cinza sua
Matéria crua sobre mim
Só ternura
Suas mãos puídas de alecrim

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Minha casa de nuvem


Minha maior dificuldade é o instinto. A magia de que sou feita, me sustenta e me extingue. O sobrenatural passa por mim e pára, faz casa. E o universo nebuloso das sensações e das premonições e dos sentidos, pode ser um labirinto. Quem entra comigo, às vezes se perde.

MILAGRES


Quando foi que passei a merecer os milagres?
Seqüências de acontecimentos mágicos, qual em sonho...?
Um dia, enchi-me de coragem e iniciei minha cruzada, farta de esperar seus sinais.
E, então, percebi que os milagres esperavam por mim, impacientes pra acontecer,
no lugar de sempre.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

JOGO DE INCERTEZAS


Não havia sombra sobre o sentimento enquanto a boca que proferia declarações de amor era a dele.
Mas, a partir do momento em que ela respondeu: _ também te amo, a lança da desconfiança triscou de dúvida sua certeza pungente de delírio.
E o amor, então, retroagiu, por medo de ser correspondido.
...
Ela, contudo, sabia que, apesar dele ter-lhe dito que a amava, podia ser que se esquecesse.
Mas que o amor era assim mesmo, às vezes ou sempre se esquece.


domingo, 7 de agosto de 2011


Sou tão católica quanto qualquer outra coisa
Minha mente gravita sobre todas as tentativas de decifrar o impossível
Calcifica-se, uma fé fluídica, com o seguir da vida
Em que se enraízam e se enredam as coisas mais longínquas
O incompreensível
E à medida em que se aparta a ambição de domínio
Mais se aproxima o sentido
De Deixar

Big Bang


Algo em morrer, parece bom
Não ser
Desvanecer-se em partículas
Reunir-se, em órbita, à origem
Transcendência

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Paraquedas

O encanto é como purpurina. Apesar do brilho, de textura tão fina, uma coisa tão delicada, tão facilmente pulverizada... Como é fácil desvanecer-se!
O limiar entre o real e o sonho, entre a coragem e o contentamento rasteiro, é indiviso, estreito.
O senso comum e o habitat seguro não conversam com o inesquecível. Pra pular de bung jump não é preciso asas, é preciso peito.
Pra ser feliz é preciso, antes, achar a saída dos labirintos que te reconduzem a si mesmo. Aqueles de que são feitos seres ímpares como os boêmios e os esposados.
Seres antagônicos dotados do mesmo defeito em pontas opostas. Enclausurados nas artimanhas do medo e suas defesas.
E, o ar, só merecem os sonhadores, os incorrigíveis, os apaixonados e soltos.
Paraquedas não se abrem à toa.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

NARCISO



Das palavras que falo
Ouvem-se poucas
Minhas idéias são as internas
E não as ditas
Menos ainda, as ouvidas
O ouvinte escolhe
Entre os caminhos
O sentido possível
Aos seus frágeis ouvidos
O diálogo é qual o aprendizado
O que se quis dizer
Às vezes fica perdido
No espaço que separa
Um ser do outro
Na vala que faz, de cada alma
Uma trilha solitária e árdua
Apesar de acompanhada
Na insistente tentativa
De compreender , de alcançar
De aliar-se a um par 
Das conversas, caminhos se abrem
Em escolhê-los com cuidado
E fidelidade, faz-se o diálogo
Mas o alcance total é inviável
Não queira a compreensão integral
Só Deus sabe - e eu
O sentido das palavras que abrem
A estrada por que caminho
A pilastra em que se apóiam os detalhes
Que me conservam indivíduo
Alcançar-me é impossível
Explicar-me, portanto
Inútil, incrível
Das palavras que profiro
Tudo o que vê
São os destinos que dita
Pra seu próprio sentido
Narciso!

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Arvoe arvre


Árvore-arve, ar-voe
Voe árvore, como ave
Arvoe arve. Voe
De casca dura
Grandes raízes
Não voa, árvore
Mas a nuvem anestesia
E o que não pode se alivia
Se tem amor
A miragem é companhia
Tudo é passagem
Mas na vontade
O galho que era árvore
Estica em asas
E alça vôo
Só o amor diferencia
Intuição de covardia
E a nuvem que anestesia
Tudo pode e alivia
Tudo chove e alivia
Torna ave, a melodia
E voa alto, em alegria
Por ser amor
Voa a árvore por magia
Com asas de passarinho
Pro seu amor
E o organismo que era outro
Liga-se em ímã
Na energia do puro amor
Voa árvore poesia
Avoe árvore ainda
Comigo arvoe árvore minha
Arvoe arvre
Arvinha minha
Comigo avoe em poesia
Porque é amor
Arvoe árvore maravilha
Que a viagem não é só de ida
Se você for

(Por mim e Marcio R. Lima)

A árvore e o passarinho


Tu andavas por aí, passarinho, com teus penachos empinados e teu andar saltitante, de galho em galho, florindo. Mas, de repente, encantaste-te com cascos gastos e falhas de uma velha e grande árvore, sobre um rochedo distante. Quiseste ficar por ali. Juntaste teus gravetos em ninhos e deliciaste-te sossegado, à sombra dela. Mas, um dia, aconteceu que de tanto enfiar-te nas fendas daquele casco, decidiste não mais voar, quis tornar-te árvore. E a árvore não pôde crer, que tendo você asas, invejasse seus galhos de cascas. Mas, depois que te aninhaste debaixo da árvore velha, teu voar parecia triste. E a árvore rechaçava: o que seria de ti, se os pezinhos que saltitavam, enraizassem? Se de tanto com ela trocar, virassem madeira de árvore? Então, propuseste dormindo, em sono de olhos vidrados que não dormem: - que tal se ela criasse asas? Mas não era possível, bichinho! – cada organismo faz sua viagem seguindo a vontade original, que rege o inalcançável. Então, ficaste passarinho, parado como um objeto manipulado, empoleirado nela, em estática. E, enquanto teu amor durava, tornavas-te parte daquele tronco, como cuco de relógio. Até que num dia bem lindo, uma brisa mais forte bateu na quina de teu bico e ouviste teu amor sussurrando baixinho, no farfalhar das folhas caindo: Amo-te, passarinho. Muito. Parta com tuas asas, serei sempre tua casa. A vontade é que faz possível, uma possibilidade. - E tu, que já sentias o corpinho e asas tesos e sem engrenagem, como um bicho empalhado, entendeste o amor que alcançaras. O encanto de ter-te encantado por uma árvore-árvore, é que aquele era um amor casa, e sempre que voltasses, poderias escarafunchar-te debaixo de sua copa cheia e viva. Não era um amor de ave, não era uma árvore-ave, não era uma arve. Era só uma árvore onde podias ancorar tuas cansadas asas. Então, sacudiste as penas, arrebitaste o corpinho e saltaste. Voaste para o vento e voltou tua cor e teu movimento. Mas teu amor ficou e, de quando em quando, voltavas pros calabouços tão ternos, da árvore que amavas.