quinta-feira, 19 de maio de 2011

Queixas sobre o poeta


Um poeta não tem crédito. Seu pensamento é poesia.E o que é poesia? Diante de todos os arranha-céus da cidade, se impondo sobre a cabeça do homem que corre?
Estrela em cabeça de poeta é poeira na cabeça do homem comum. Às vezes incomoda a vista e resseca a íris. É como uma mordida de inseto que coça e incha, mas não se sabe de onde veio ou pra quê serve.
Um poeta não é alguém em quem se confie. É um artista. O que pode saber da vida?
Tudo num poeta é enigma.
Mas é a lógica que determina a seqüência da vida. A comida dentro do armário, os chinelos estendidos no assoalho, a grana amontoada na carteira. Os livros repletos de dados sobre a mesa da cozinha e as contas, todas depositadas para o dia do vencimento, em alguma gaveta específica.
Isso é a vida. Faço o quê com tua poesia? Com tua mania de botar flores em tudo e jogar purpurina na mobília da vida, como se tudo precisasse ter brilho pra ter sentido?
Fizeste uma poesia uma vez, o nome dela é “Encantada”. Ah, poeta... quanto tempo se passou desde então? Continuas irremediável! Queres contagiar quem está ao redor com tuas teorias impossíveis e ainda recomendas que leiam: “Encantada” e outras coisas, muitas postagens atrás... Esqueces, poeta, e te conformas.
Um poeta deve usar óculos pra enxergar que a vida é dura e composta de tijolos. De asfalto, pedra e telhado. Que pra se viver é preciso casa, é preciso carro, é preciso banco. É preciso título, é preciso nome.
Poeta... Ficas com essa coisa de pensamento e indagação enquanto alguém dá o malho por ti, sem tempo pra filosofisses... Enquanto alguém batalha, pensas em amor e sonho. Companhia, liberdade, verdade da vida.
Por isso, não és alguém pra quem se possa pedir conselho ou opinião sobre a vida. És um ser alheio.
Por que não sentas, estudas, sê alguém na vida? Casa com alguém que te pague as contas e te faça outro filho, pra que te ocupes, tenhas seu lugar no mundo e deixes essa obsessão por ser quem és de verdade, curtindo a liberdade que te impele à solidão mais crua?
E que, ainda assim, não te feres. Nela, encontras teus conceitos, tua ânsia de embriagar-te. Não te entendo.
Por essas coisas, poetinha, não és alguém em quem se confie. És só uma pintura antiga, que às vezes a gente olha admirado, às vezes a gente não compreende e a maior parte do tempo a gente acha fazer parte da paisagem, e ignora.

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