Um pouco de nada, às vezes é tudo.
Um pouco de vazio pra perceber de verdade quais são os sentimentos e o estado de espírito.
Sem esse fundo, esse piso, a gente só imagina o que sente. Saber mesmo, a gente só sabe se se enclausura consigo por um tempo, sem declarações, sem companhia, sem interferência.
E então, gestos e perfumes que eu julgava perdidos, vêm pra mim e me rondam, auras tão densas quanto corpos, e respiram no meu ouvido frrrruuuu - eu sinto o vento e o calor, uma brisa de verão na minha nuca, um abraço perfeito no meu ser inteiro.
Mas não é só isso. Debaixo de tudo, descubro meus olhos baixos - olhinhos de esquilo - e minh’alma se deita, cansada e encharcada. Encosta-se nas paredes, lânguida e plácida. E eu me ponho a contemplá-la, e penso que ela é tão bonita...
Quando ficamos a sós, eu olho para ela e ela me ignora. Não quer mais ceder aos meus caprichos e conveniências, às minhas ignóbeis obrigações. Vira-me a cara e finalmente se sente à vontade: meu rosto sem sorriso.
Então nos estranhamos um pouco: por que ela não é tão colorida, por que ela se esgueira? porque ela não me acolhe e me convida pra um passeio branco e pacífico? - ela aprecia os vales e as florestas, gosta de se camuflar entre as folhas, chover com as nuvens,
Vive molhada.
Mas depois de um tempo com ela, eu já não a rejeito. Passo a apreciar seus cinzas e marrons e penteio com os dedos sua matéria de sombras: uma textura de clara de ovo, só que escura.
E então as lembranças retornam, fincam o pé no meu entorno e pronto! Lá está o meu mundo.
Todos os meus temores e desejos numa valsa. Minh’alma no meio.
Eu e minhas vesículas vazias, imperfeições globulares onde cabem ternuras de antigamente e esperanças perdidas.
O nada nos devolve uma à outra. E a realidade é bonita. É o que de mais bonito a gente pode ter.
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