Quando a gente sabe chorar, as pessoas não notam. As lágrimas caem habituadas, molemente. Não mancham, não tingem os olhos de vermelho que, de tão bem acostumados, também não incham. A maquiagem permanece intocada, a gente sabe como enxugar a água da alma sem borrar os cílios. Quando a gente sabe chorar, as lágrimas vazam faceiras, destemidas, pingam fartas sobre as coisas, mas não deixam marcas, nem rastro. Quando a gente sabe chorar, o outro não vê, não questiona: “ora, por quê?”. A gente chora como quem fala um palavrão ou espirra. Quem sabe chorar não se envergonha e não se esconde. Não é preciso. Quem chora convicto e sem medo é como se vestisse o uniforme cinza do pessoal da limpeza, atravessa os caminhos, invisível, as lágrimas compridas vestem-no inteiro, como um escudo. Quem sabe chorar não segreda, seus abismos ficam expostos, cheios de poças, das lágrimas em que se atira. Mas não importa, ninguém enxerga. Quando a gente sabe chorar, as lágrimas são como objetos no lugar ou fotos na geladeira. Depois de um tempo, a gente já não considera.
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