segunda-feira, 28 de abril de 2014

Amor novo

Vêm sobre mim
seus personagens
:mocinho, bandido,
palhaço,
galã apaixonado
bêbado sem cura.
E invadem-me a boca
seus gostos
- tantos variados -
de doçura e loucura,
de luxúria e cigarro.
Este lugar proibido
vaza em esquinas
do imaginário,
as bordas do coração.
Deito-me num chão
de terra,
sem vestes, sem passos.
A rua anda por nossa pele,
a lua anoitece-nos
o brilho dos olhos
: chama inflamável à paixão.
Atrás dos
muros,
nos degraus do
mundo
a esperança e a desilusão
no mesmo patamar.
Uma senhora desce os óculos pra ver bem
o amor novo que nasce sem
de ninguém ter permissão.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

filme indecente

É bom ficar pensando
Em silêncio
Aroma de morango
Na língua, na vagina

Viajar na lembrança
Da tua boca na minha
Como quem bebe um Porto
Traga um absinto

E sentir-me embrigada
Tonta, louca, rendida
Querer um quarto vazio
Um cômodo inteirinho

Pra desembrulhar um por um
E em paz, cada beijo
Todo o veneno
De nossos corpos unidos

Ver outra vez desenrolar
A tua pele sobre a minha
Em cada ato, sem corte.

E reviver este amor
De emoção e carne,
Como um filme.

domingo, 13 de abril de 2014

homenagem

vou escrever um poema pra você
mas nunca vai estar à sua altura
ainda que eu seja mais alta
e nossos versos tenham a mesma espessura
você será sempre Bessa
e eu sempre nessa
procura.

L.G.

From now

Quando começar a andar na minha direção
Deixe suas canetas onde estão, sua escrivaninha
Traga apenas a paleta de cores e os pincéis
Talvez o lápis HB
E aquela réplica de Picasso
Que remete a seu gato esgueirando pelos cômodos
Traçando um andar malicioso pelo piso
Enquanto trança seu corpo esguio e fofo
Entre suas trêmulas pernas.

Traga o vidro daquela pimenta italiana
E seu livro de receitas da República Tcheca.
Traga também seu travesseiro
- Ninguém dorme direito com os pensamentos deitados sobre travesseiro alheio.

Quando começar a andar
Reúna todos os panos e retalhos
De roupas suas, desfeitas -
Talvez aquelas de quando ainda era criança ou não tinha este apetite pelo negro das trevas na vestimenta
- e guarde.
Quando for a hora
Vamos coser aquela linda colcha pro inverno em Praga
Em seguida dos passos de Kafka
Relembrando os dias em que não éramos
O que decidimos nos tornar 'from now'.

Quando estiver vindo, apare a barba
Escolha finalmente uma cor vibrante
E simplesmente vista, simplesmente sinta-se
Num olhar colorido e intenso
Como o sol atrás dos montes
Da linda praia brasileira de Itamambuca, num janeiro qualquer.

Lá, empreste-me seu chapéu de abas pra eu evitar as sardas.
Acho lindo e exótico esse seu chapéu,
Parecido talvez com aquele uruguaio
Que eu não trouxe de Montevidéu, das férias de outubro passado
Depois de uma semana árdua e quente na argentina Buenos Aires.

Quando você estiver a caminho
Esqueça as fotografias.
Deixe também seus livros
- o jejum às vezes ajuda a assimilar melhor os nutrientes da próxima refeição.
(Sou uma pessoa de muita fome
E muita pele.
Talvez por isso escreva
Talvez por isso queira tantos lugares na lembrança
E tenha tanta gente na ponta da língua.
Talvez por isso carregue
Tanto fardo nas costas
E coração sob a sombra dos versos.)

Mas venha
Vamos pelas ruas de Cuba
Ou à procura de Titicaca
Depois de uns dias em La Paz
Até alcançar o cume
No Império Inca
Onde aquelas mantas coloridas
E sua mão na minha
Irão tirar o grisalho dos versos que te conduzem mundo afora
E deixar, em lugar, o assovio suave e selvagem
De um indígena escalando o horizonte
Enquanto caminha a cordilheira dos Andes.

Lári G.




sexta-feira, 11 de abril de 2014

Vez em quando

Tem dias que te amo
Dias noturnos
Cheios de oceano
Negro e profundo.
Dias imensos
Em que me atropelo
E sonho esquecer
Este amor vez em quando.
Que faz que me abandona
Mas só engana.


L.G.

two poets

I like to be your simple home
with the sun smiling on my roof
I like to be just a painting
or a dream
while the life walks without us

I never could be so perfect
than I am with the ocean before me.
I never could be so beautiful
and you never couldn't be so gentle
if didn't exist this poetic distance
separating our bodies

but I like that I can to be
finally, something easy
I like to think that I can be soft
like a cloud or a butterfly
fliting trough the trees

I know that everything we live
now, is like a gift or a sound
coming from behind the mountains
or hidden in the wild forest

At last, who could resist
the brilliance
that survives
in passionate eyes,
and to heat inside the heart
of two poets?





L. G.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Não pode

Como pode que às vezes eu ame
Só às vezes
E outras vezes despreze
Abomine, ignore
Pense

Como pode que às vezes eu clame
Por ti, indefesa?
Que às vezes eu queira sua pele
Sua incandescência
Indecente

Como pode
Meu anjo-demônio
Esta surpresa a cada instante
Nada/nunca
O mesmo

Como pode, meu amor
Depois de haver tirado minha paz e certeza
E feito de mim um tapete
Que ainda eu queira
Às vezes

O sabor da tua língua
A tua veia na minha
A tua teia???

I'm enough

I don't need anyone
I can survive without you
I'm okey now and from here I know
Nothing can take my peace if I don't permit

Listen what I'm saying in your ears
I'm enough for my hapiness
I'm enough for me

While the train cross places that I never saw
My thoughts sail without me
Without water or anything

While you cry without me
I follow without anything
I follow with myself only
That it's all I need

I don't remember yesterday seeings
I don't belong to the past
I don't belong to you
And nothing and anyone belong to me

Listen what I say in your ears now
I'm enough
It's just the necessary
I'm enough for my hapiness
I'm enough for me.

andar perdido

o coração
em nova canção
dobrar esquinas
de não se sabe onde
e ver horizontes
nunca vistos antes
talvez nunca depois

andar por aí
livre livre
no desconhecido
sem domínio
nem ilusão
de saber o caminho

andar no estrangeiro
como um estrangeiro
olhando tudo pela primeira vez
tudo talvez
não se sabe
pela última vez

as comidas
os cheiros
os rostos
os sons
tudo muito raro
sem comparação

andar por ruas estreitas
por largas avenidas
por sinuosas vielas
por pontes sombrias
sem saber nome nenhum
nem qual estação

andar perdido
pra quem sabe acontecer
o destino.

luz azul

tão lindo é ver
sorver
com pálpebras molhadas
o néctar do mundo

miúdo, no entanto
o tempo gasto
o encanto

parece que é necessário mais

mais tempo na estrada
mais palavras

parece que é necessário o outro

que ficou do outro lado do oceano

parece não ser necessário nada

menos euros e flys
menos malas

apesar do belo
emerge da perfeição sinistra
o ferro

algo de indigesto
no império
da nação sobre a criatura

do patrimônio (uma grandeza sem tamanho)
sobre o ser humano

são muitos caminhos
muitos sentidos
e uma língua única
dita de maneiras várias

é lindo, mas um tanto triste
que uns vivam sobre ouro
enquanto outros sequer comam

é bom andar pelas ruas
a qualquer hora sem medo
mas será possível
se de onde eu venho
não é possível?

vem cidade luz
cheia de estrelas, monumentos
vem
me deixa imergir neste sonho
algum tempo

me deixa respirar este ar
sofrer outras dores

só algum tempo

(do outro lado da rua
um indiano
demonstra seu produto
atirando para o alto
luz portátil azul).

L.G.



amanhã

Hoje
Tantas dificuldades
Lágrimas
Pranto
Hoje
O desencanto
A desesperança
A desilusão
Hoje
O desespero
O desDeus
O apelo soando sozinho na escuridão

Amanhã
O amanhã.

L.G.

ausência

talvez eu volte a escrever em papel
talvez eu volte a ser quem eu era
quem sabe, meu bem, eu consiga
ignorar o trajeto, as músicas deste novo tempo
e tornar-me outra
ou a mesma. Quem sabe?
tantas vezes ele quis ir
tantas vezes o medo ficar
e a preguiça de enfrentar
de viver
quantas vezes sem fim
veio e deitou-se na soleira da porta
vestida do pesadelo
de sentir-se só???

quem me vê falar acredita que eu tenho medo
que eu temo ser só

não conhece a verdade desta alma eremita e livre
independente e só



apesar disto, tenho, sim, medo
mas ele faz parte de ser inteira
indivisível

meu Deus olhe pra mim
ponha seus olhos sobre este velho caderno
e rédeas neste temperamento diabólico que Te enfrenta
e questiona a Tua vontade
a Tua existência
e ainda teme o que é tão menor

a ausência
só a ausência.

L.G.

Praga do Tim

Ando de gol 2005
Preto
No meu rádio toca 89.1
Rock
Moro na mesma vila desde que nasci
Quase nem parece a mesma
Prefiro bijuteria à jóia
As maiores

Não ligo pra marca de roupa
Nem conheço modelo de carro
Tenho dificuldade com nome de rua
E minha memória não é das melhores
Minha ambição é pouca
E de tanto cantar
Quero amor sincero, eu só quero amar
O Universo me deixou o amor
Como único patrimônio.

L. G.

Em Paris

Um homem defecando no meio da rua
Sem calças, nu abaixo da cintura
Não se agacha, facilita estar a meio corpo
Sequer olha para o lado, seu lugar é a rua
Não há banheiro pra turistas, que dirá para esses tipos
Enoja os passantes, os leitores
Primeiro aquele espanto, depois o horror de encarar
As fezes de outro a desbundar
O deslumbre de Paris
Com seus prédios médios de janelas grandes da Belle Epóque
Retrato da opulência e arrogância
Disfarçadas na elegância
De Paris
...
Sim, ela é linda
Ela brilha como ouro aos olhos do sonhador
Sim, vê-se a Torre a milhas
Há pontes, há o Sena, a Monalisa
Mas alguém tinha que fazer esse serviço
Cagar na cara do turista, do parisiense, desta Europa rica
E devolver um pouco da bosta toda que ela espalha pelos continentes
Há séculos e séculos atrás
E continua
...
Tem gente sobrevivendo do comércio de bugigangas em Paris
Gente morando nos buracos esquálidos dos metrôs de Paris
Urina pelas escadas, quantas escadas, do metrô repudioso de Paris
...
Ainda que se acendam mil luzes
E que se veja a Torre a mil milhas
Nada apaga esse ar rude
Que não considera necessidades primárias
Que iguala o homem mais glamuroso e perfumado
Ao mais pobre e coitado
...
Aquele homem e sua bunda suja
E o excremento que a todos enoja
Mas que sai de dentro do corpo humano
De todos, humano
...
Aquele homem e sua coragem
E sua loucura e sua vontade
Manchando a honra da Cidade Luz
O perfume francês da Champs-Elyssés

Não me sai da memória.

L.G