segunda-feira, 20 de outubro de 2014

não, eu não aguento muito
não tenho todo este tempo
tenho urgência de felicidade

aguentar não está no enredo
quero aproveitar o tempo
e viver o auge

mergulhar fundo, buscar o ápice
fazer dos grandes números
meus melhores anos
o seu maior defeito
e o meu também
é sua maior qualidade
a de todos nós

será este o indecifrável enigma
dos amores findos
dos aromas inebriantes
que o ar impregnam ?

quem vai saber
se a evolução de si
não é o fim
de nós?

Os cabelos dela

Ela andava por aí
Os cabelos imóveis
Nem o vento, nem a chuva os tiravam do lugar
Cabelos afro...
Mas as ideias SEM FRONTEIRAS
Navegavam como areia
E às vezes paravam numa duna,
Às vezes num deserto
Às vezes, numa ampulheta
Mas mesmo assim, qual o tempo
Andavam
Escorriam constantemente
Como aqueles dedos que um dia
Perderam-se nas entrâncias
Dos seus cabelos negros.

pipa de Cutrale

Um pipa de cutrale à frente do carro
placa de Bebedouro
destino não se sabe
você pensa e fala de vontade
de sugar o suco de laranja
de canudinho
pssssssss
por que vc viaja?
já não sabe que o estômago não aguenta?
essa azia companheira não perdoa
por muito menos te atormenta
quem te aguenta neste congestionamento
lenga-lenga até São Sebastião
quem diria que dois de janeiro
a gente pegava um trânsito desses?
já não basta esta garoa na Serra
nestes dias pós- reveillon
ahh! que importa se o céu se cobre
ou se o chão molha
em janeiro, no Brasil, é verão
e lá vamos nós outra vez
mata atlântica nas bordas
e trópicos no tempo.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

rangendo os dentes

Tenho escutado você ranger os dentes na madrugada
Você não dorme como antes
...
Inveja-me o sono das crianças
De braços abertos pro universo dos sonhos
Sem um pestanejar
Mas você não dorme como antes, coração
Você range os dentes
E o barulho deles cerrando uns nos outros
Me desperta, me faz pensar
Nos barulhos lá fora
Na manhã seguinte
No medo de morrer, adoecer ou ficar louca
No medo de ficar só
De estar só
Por quê?
Você, coração, range os dentes no meu peito
E eu te escuto e penso
Quero voltar pra casa
E aqui estou:
Novamente acordada.

o amanhecer

eu jamais poderia fazer o que faço no escuro
eu jamais poderia usar a noite, como uso o dia
eu preciso da luz do amanhecer
ver renascer a vida
todo novo dia

é bom quando amanhece
quando apesar de tudo, o sol nasce outra vez
pra se acreditar de novo
ter esperança de novo
ler, escrever, cantar
sonhos

essa luz, sabe
que vem do sol
deixa as coisas coloridas
a noite no passado
vê-se o mal de outro prisma.
amanhecer, em si já é uma alegria.

e ao mesmo tempo, a brisa nova que nasce
oferece uma folha em branco, limpinha
- ah se eu pudesse viver só esse dia hoje
e nada viesse escurecer minha vida
a não ser a noite.
escrever deslizando...

moda que deturpa até a escrita em si
quem escreve tropeça, não desliza
quem escreve encasqueta
com o fonema que a letra desperta
enrosca no sentido
embrenha na tacitura da rima.
quem escreve queria
levar a vida na boa
mas delira na estrofe imagética
vê personagens na esquina.
embebeda-se no boteco mais perto
só pra trombar com o complexo
e ter assunto pra uma linha
ou um soneto.

quem escreve não desliza - quem dera!
A vida é muito grave e sisuda
Leva as pessoas às vezes
E ainda cobra obrigadas, sorrisos.

Comigo não, ingrata!!
Morro de raiva
Praguejo cada lágrima, enfureço.

Não tenho etiquetas
Nem boa política
Em despedidas

Se te finges de besta
Insulto em N línguas
Blasfemo

De nada me valem justificativas
Frases feitas.
Não acredito.

vamu junto

vamu junto!
você pensa que é fácil, mas não
: às vezes é preciso apertar o passo
às vezes é preciso perder a pressa
às vezes o tempo do outro acelera
às vezes se perde o seu tempo

vamu junto, colega!
quase um dilema
nessa dança em que o ritmo alterna
e o piso sacoleja
é difícil acertar o passo
encaixar o momento

vamu junto! ele disse um dia
e a ela o convite soava
como coisa nova, moderna
mas não!
o mesmo desafio de sempre
com letra menos brega

vamu junto!
como é difícil
dar a mão, o braço, o mundo
pra que outro siga consigo
num passo compassado
num sonho dividido

vamu junto, meu amigo
pega esse atalho
no exato instante
em que se laça a fita
de encantos casados
e vida vivida.

não sei mais falar de amor

falar de amor
eu não sei mais
não sei mais o que é
em quantos se divide
e se é ainda aquele de antes
inadiável
improrrogável
intransferível

não sei mais dessas coisas
porque o amor
essa água que cai de um cascalho alto sobre os ombros
(com a força de uma torrente de água
em cachoeira véu de noiva incrustada em montanha virgem)
pode ser tantos...

eu sabia dele
podia identificá-lo com o corpo
com a alma
com o gosto
com a tara

hoje não
só escrevo o amor
que amor? - duvido
que amor? divido.

aquele amor que toca à distância
inebria os sentidos
e alcança
ainda que ausente de palavras
ainda que ausente inteiramente
se foi com as certeza do ontem
é só fuligem

mas existem outros
cheios de medo, de dedos
vazios de devastação
: irreconhecíveis.