sábado, 11 de dezembro de 2010

PALAVRAS CONTIDAS


Eu sei amar de longe. Não sei quando aprendi. Ou melhor: sei, mas não quero dizer agora. É uma vitória aprender a amar de longe. Acreditar que o pensamento é capaz de se comunicar sem as palavras ditas. Que as palavras podem se materializar sem a fala. Que as palavras se locomovem por ondas e são capazes, mais que as palavras ditas, não só de dizer, mas de tocar, de acender. Palavras estão represadas em mim e, apesar de fazer terapia para dar vazão a elas, elas dóem aqui. Porque são muitas e porque não são apenas as palavras que eu não digo. São também as palavras que eu não ouço. Mas não importa, vou navegar com minha alma sinestésica pelas ondas do pensamento até quem eu quero e despejá-las, letrinha por letrinha. E, com todas as letras tocarei e reverei bem de perto aqueles a quem quero dizer, a quem quero explicar, a quem quero bem, quero mal, quero não querer. Bem de perto, à medida que derramarei sobre ouvidos distantes e despreparados, todas as palavras contidas, vou respirar um pouco mais fundo, sentir um cheiro, fazer um vento. E quem sabe nesta hora não venha, com o ar que inspirarei, as palavras que não ouvi, que tanto me dóem e que talvez jamais eu ouça, a não ser assim: se eu for buscá-las.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Deixe que chova aqui dentro!


Quando chove no verão, depois de toda aquela sensação de sufocamento e calor, os poros inundados de suor, a cabeça rodando devagar, slow motion, então começa a ventar. E é um vento maravilhoso, refrescante, apesar de nada comedido, quase agressivo, eufórico. Mas é um vento de frescor, de alegria, de fôlego. É o vento da chuva que se aproxima e que levanta a poeira e traz pras narinas o cheiro de terra molhada que a quase todos agrada. Então, aquela sensação de calor vai sendo tomada por outra, tão bem vinda, reconfortante, almejada. Alguém se lembra de fechar as janelas, mas para quê? É só água! E seca, e evapora, da mesma maneira que a água salgada depositada na pele encrudesce: seca e miúda, na tez aliviada. Deixem as janelas abertas! E pinga, pinga dentro da casa. A chuva também agrada às paredes esturricadas, ao chão trincado pelo calor autoritário, dominador. E então venta, o vento de chuva macia, que percorre o imóvel, atravessa as janelas em corrente. Há pingos pelos cômodos e pessoas aliviadas, debruçadas nas janelas. Está molhando aqui dentro, alguém grita. Mas deixe, deixe que molhe! A chuva é bem vinda, e logo passa, logo seca. É só água, que nada estraga, só alivia.