quinta-feira, 28 de maio de 2015

anjos

ora ou outra, eles surgem
sem que se saiba o que/quem são
e ora ou outra nos assustam
(a inabilidade de encontrar
alguém de verdade bom)
...
causam susto
as coisas boas da vida
as boas sensações
(felicidade
olhos que brilhem
magia)
...
no meu pensamento
compreendo
que você não existe
é mais um menino
caído do céu
pra afrontar ceticismos.
sensação dúbia
: o que sobra
: o que falta
e o quadro inclinado na parede espiando a sua dúvida
sua vontade de surpreender-se com a vida
esta coisa incrível, que bem se sabe
surpreende apenas quando quer.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

que me desculpe o Chico,
mas nada é "pior do que se entrevar",
enquanto se puder correr, correr
ir por aí
tá tudo bem.

flores

eu amo as flores
são belas, tão belas
não precisam de palavras
nem de pernas
são elas
: únicas, perfeitas, completas
e ainda levam o perfume
que não se enxerga
nem se esquece.

o que há de errado com a felicidade?

eu gosto de ser feliz, gosto de verdade.
o problema da felicidade é que ela nem sempre é sincera. quando rio demais, sinto em seguida uma baixa, como depois de tomar-se uma bebida alcóolica: na sequência da euforia, um relaxamento, uma apatia...
algo na gargalhada em demasia toma-me energia e me devolve ao estado depressivo, como se houvesse uma cota de bem-estar por dia que, se excedida, será cobrada na mesma medida.
às vezes, pode ser que não se conte em 24 horas, mas em estações. às vezes, quem sabe, em existências.
em alguma vida, portanto, eu devo ter sido muito, muito feliz.

Estrela

Estrela, estrela
tu riscaste o céu por brincadeira
eu, ingênua, acreditei

agora vivo de esperas
(amanhãs que não chegam)
e temo pedir ao destino
os pedidos que em mim carrego

e ele entender-me mal
dar-me precipício por paixão
cárcere por amor
solidão em lugar de paz

então, não pinto o olho do gato japonês
não escrevo meus desejos num papel
não peço nada ao Papai Noel
sequer pulo onda em réveillon

depois que tu, estrela cadente
fizeste-me aquela desfeita
fiquei muito tempo à espera
à espera de amanhãs

hoje vou queimando janelas
indo direto ao ponto
já não creio em receitas ou rezas
bruxa, feitiço, poção

que solução, senão esta
se encontro portas fechadas
jardins encobertos de névoa
migalhas de coração.

superstição

eu odeio noites com risco de baratas
sinto nessas noites como a solidão é maléfica
vi uma barata lá fora, através da janela
fechei tudo o que dava, mas elas atravessam pelas frestas
essas noites quentes em seguida de dias escaldantes
(
o sertão vai virar
...
)
costumava chover em todos os meus aniversários...
uma vez ganhei uma sombrinha
adorava abrir aquela sombrinha linda em qualquer lugar, até dentro de casa
minha tia dizia
não abre sombrinha dentro de casa, menina, que você não casa

deu no que deu.

povo brasileiro

eu quero mesmo é me misturar
sentir que sou essa coisa toda
cheia de música e cor
de pronto e arrodeio
(o português do Sergipe)

sentir o sol nos cabelos e corando a pele
ver as barracas de fruta, pimenta, caju
ouvir o falar e a alegria do povo
concorrendo em alto som
: música poluente

a mulher na calçada
pede esmola ao megafone
(se a moda pega
não tem mais Paris
não tem mais Roma)

as pessoas deste Brasil
é que fazem ser tudo assim
ô povo hospitaleiro
não se vê resposta torta, cara feia
seja a pergunta tola, seja impertinente

as pessoas deste país
é que fazem o Brasil assim
no que tem de bom
no que tem de menos
(o mesmo que é qualidade, é defeito)

as pessoas, as pessoas
os brasileiros
é que fazem o Brasil assim
: tudibão, tudibão
ou não.


E o questionamento...
Contudo, eu sei, enquanto se estiver que questionar o mundo, o seu andamento, as trilhas por que caminha a vida e seus contrapontos, não se estará integrado, como se quer.
Quando se está integrado, se está. Não há mais perguntas.
Você está ali, como uma planta, um pedaço de chão, uma duna de areia, um peixe sem pálpebras.
Quando se está integrado, as perguntas findam.
Enquanto houver perguntas, tantos por quês, é porque ainda se está a caminho de ser.

certezas de mentirinha

quisera eu ter tantas certezas
como podem ter tantas certezas
certezas assim tão acesas
absolutas, incríveis
certezas intransponíveis
unânimes, imbatíveis
estão cegos de tanta certeza
e matam-me de inveja
quisera eu ter metade delas
por que tantos (e tanto)
se arriscam.
meus amigos, boa sorte
a todos nós, ao Brasil
salvemo-nos, nos salvem
não do candidato pior
mas, antes, da idiotice.
Eu não odeio a elite, ou a periferia. Eu odeio quem exclui.
minha maior inveja, ouvi-lo dizer que viveu tempos tão felizes que nem se lembrava de como era ser triste.
eu, mesmo feliz, nunca posso me esquecer como é a tristeza.

chuva que não cai

ela está pendurada no céu
doida de vontade de cair
como a lágrima apertada contra a íris do olho
que resiste ao choro
e não quer chover
pra não dar o braço a torcer.

derrame-se

ah não se acanhe em derramar-se farta
por favor, caia
chova sobre as ruas, chore suas lágrimas
não se segure mais
ah chuva, sua sumida
pra que assim tão contida?
chova com vontade
chova sobre a Cantareira
e a Billings
chova sobre Ribeirão Preto e Itu
chova sobre a capital paulista
coberta de névoa cinza, poluída
chova sobre minha Santo André
já ressequida
judiada, ressentida
chova, chova, chova
de preferência a tarde toda
chova pra acalmar os corações
e acalentar almas exaustas
neste fim de eleições
chova pra lavar a sujeira
chova pra acabar com a seca
dar vida a novas sementes
verde e viço à natureza
e água nas torneiras.

excesso de cicatriz

não é difícil aos outros
esquecer-se de mim
(sou esquecível).
eu, ao contrário, padeço
de excesso de cicatriz
ela incha, faz lombada
e como não se apaga a marca
também não me brinda
o esquecimento
...
tudo fica aqui dentro
e vou morrendo
por falta de espaço
pra recomeços
vou morrendo
porque não me deixa
o sentimento (eterno)
que pra sempre me segue
(só tem começo).

chuva

barulho de chuva, que coisa boa! como rezei por essa música! principalmente assim, à beira da janela, à meia noite, cantando pra eu dormir num ritmo que não cessa... eu adoro.

chove chuva, vem, lava. chove doce, molhada, sem pausa... pode chover esta noite e amanhã, pode chover a semana toda, se quiser, mas tem que ser ritmada e calma, como um trem que não acaba, a correr sobre o trilho... chove molemente sobre as telhas e represas, chove acostumada às primaveras umedecidas. chove sem medo, chuva, de quem algum dia te deu desprezo, (hoje quem te detestava, já te venera). aproveita e chove, chove sobre a terra ressequida e realiza o sonho que sonhei outro dia: a noite inteira você comigo ... chove...

companhia

Quando a gente viaja meses inteiros, o mundo se torna um pouco nossa casa. Como quando se anda sozinho pelas ruas: na presença mais passageira, sente-se uma companhia.

silêncios

aqueles silêncios sempre estarão muito vivos em mim... aqueles silêncios longínquos, vilas mudas, inabitadas, falta completa de vínculos, param meu coração...
Não há rostos nas minhas lembranças. Só ovelhas, janelas e silêncios.
nesse mundo de coisas que passam
a saudade fica.

fim

sinto tanta saudade
que nem sei de quê
...
não importa, a vida segue
é só encher o tempo
de ponto e vírgula
e esperar o envelhecer
...
um dia tudo (tudo mesmo)
termina.
vc que me odeia
obrigada!
estava precisando mesmo
de uma paixão qualquer
(deus me poupe do que é ameno).

sentido

tem hora que não acredito em nada
a vida é ingrata
a gente acha motivo/sentido
só pra viver
a gente acha motivo/sentido
mesmo sem ter.

procura

é essa procura
que me move
você
que tem as respostas
não me comove
(minha locomotiva
é a incerteza).
eu te amo
haha!!
alguém se lembra o que é o amor?
amar é trocar a caixa de areia do gato
recolher o cocô do cachorro
pôr o neném pra arrotar
o amor não tem nojo.
o amor participa
o amor é agente
...
amor que não transforma
que não afeta a rotina
é moda
ou vaidade
(desprézo).

diversão (para Ricardo Bocca)

fico escolhendo o caminho certo
o caminho certo parece sempre
fazer-me infeliz

eu tento, tento, forço passagem
mas a porta não se abre
enfim, rejeito moral e bons costumes

e divirto-me.
o que a vida quer de mim?
o que a vida quer de mim?
...
respostas prontas e fórmulas
às vezes nos impedem
de perguntar e de descobrir
:o que a vida, afinal, quer de mim?
minha cachorra, se chega à noite, entra em sua casinha e se deita, faz beicinho de dengo, nenénzinho com sono...
gosta do abrigo, um pedacinho de mundo só pra ela, seu escuro, seu quartinho (talvez sonhe?)
eu, sua dona, sou como ela: tenho minha própria caverna (isso muito facilita!).
ora ou outra, eles surgem
sem que se saiba o que/quem são
e ora ou outra nos assustam
(a inabilidade de encontrar
alguém de verdade bom)
...
causam susto
as coisas boas da vida
as boas sensações
(felicidade
olhos que brilhem
magia)
...
no meu pensamento
compreendo
que você não existe
é mais um menino
caído do céu
pra afrontar ceticismos.
fico no fundo
porque, no fundo
temo não merecer mais
...
mas todos sonham
V O A R
tornar-se algo melhor.

no fim de tudo, só fica o amor

ive tantas vidas numa só, fui tantas que às vezes me esqueço... a ordem do tempo às vezes invertida: fui criança, muito criança, depois velha, depois mulher e então adolescente, para novamente ser mulher e agora ainda sinto como se fosse uma menina...
muitas coisas e histórias e amores e segredos, alguns porres, alguns erros, muita reflexão, uma mão de amigos, uma centena de beijos, alguns retratos vivos, de lugares e personagens que irão comigo daqui pra não sei onde....
foram tantas vidas e companhias e conclusões e poesias e lágrimas e medos e desejo de viver tudo, e desejo de morrer logo e andanças e projetos e desistos e insistos e paixões (mais do que a razão recomenda)...
foi muita vida pra pouca estrada, muitos começos pra caminhos às vezes curtos, às vezes ermos. muitos finais pra muito cedo, muitos poréns pra pouco enredo....
foi muito por dentro, muito por fora, foi muito intenso e continua....
nem sempre entendo, às vezes penso, às vezes só vivo e por isso choro, é muito desgaste, muito empenho, muita entrega (haja coragem!) e ainda enfrento os desastres: gente como eu só acaba aos bocados.

(no fim de tudo, só fica o amor)

o medo

às vezes a gente tem medo
(o medo pode ser um presságio
um instinto de proteção)
mas se o abandono te abraça
o medo vira quase nada
: prefere-se qualquer coisa
à escuridão dos tempos
em que nada acontece.
sensação dúbia
: o que sobra
: o que falta
e o quadro inclinado na parede espiando a sua dúvida
sua vontade de surpreender-se com a vida
esta coisa incrível, que bem se sabe
surpreende apenas quando quer.

a felicidade

a felicidade é tão delicada, tão suave e tão rara que quando se está nela, como num mergulho na piscina, prende-se a respiração pra ficar ali o maior tempo possível.
ainda que se saiba que o oxigênio, em breve, será pouco, abrem-se os olhos embaixo d'água pra vislumbrar todo aquele azul maravilhoso no silêncio da imersão: o azul, tanto azul...
quando a gente sobe pra respirar, ainda está inteiramente contagiado pela magia, o corpo relaxado, a mente em outra percepção.
a felicidade não cabe em palavras.
olho minha cachorra no quintal
ela deita, late, dorme, corre
não questiona o que vai fazer depois
ou o não fazer de agora
...
apenas está, apenas existe
e já é uma dádiva.

sempre saudade

eu entendi quando ela foi morrendo
e fui deixando ela partir aos poucos
antes mesmo do fim
...
eu entendi que ela se despedia
quando seus olhos ficaram cinzas
e ela não gargalhava mais como antes
...
os cigarros eram muito poucos
já não sentava na beira do poço
eu entendi que ela estava indo

saudade 2

a gente sente isso assim
esse buraco, às vezes
por causa da saudade
...
a saudade sempre vai existir
senão do passado
do futuro
do antes ou do depois
(o tudo nunca é
o que deveria).

saudade

uma noite ela me chamou
vamos rezar
eu queria ser uma menina muito boa
rezar bem rezado
pra Deus se orgulhar de mim
mas o terço era longo
o pensamento vagava
e eu só via a chama da vela
em frente da imagem
e a voz grave daquela velha
puxando as Aves
: minha bruxinha de amor
(sinto saudade).

solidão

Tenho que me separar um pouco
(aprendi a ser assim
ou sempre fui assim
já nem sei)
quem se aprofunda nas relações, não consegue flutuar por elas
como um beija-flor, paira
mas com grande esforço
é preciso bater as asas um zilhão de vezes pra estar sobre as coisas, sem tocá-las
muitas energias entrelaçando-se desesperadas
e não quereres que se encontram
disfarçados de querer
posso me desligar da vida que levo sem nenhum prejuízo
mas não posso perder o contato comigo, sem dor ou doença
aprendi a andar pelas ruas sem companhia
e sentir-me acompanhada do mundo, quando estou sozinha
aprendi a viajar devastando tudo
mas, principalmente, a deixar fluir ao acaso, os caminhos
e ver como Tudo me protege
e como as portas se abrem
e as estrelas se acendem
- músicas soam nas esquinas
e meninas brindam no forte sobre o mar -
de repente, me deixo e me encontro
sou eu quem dita o que será
(ao mesmo tempo que não
: tudo já está certo
o domínio das coisas é uma pretensão
aliada do caos, da confusão)
tenho sorte de poder andar muitos trajetos
calçadas de pedra ou de terra
repleta de mim mesma
...
lembro de ti
: sou também eu
um pouco de Deus.

estado de amor

uma alegria
de existir e de ser
e transitar entre montes, esquinas
dizer coisas impossíveis
e dançar em plena avenida
sem música, sem companhia
estado de amor ilumina
os olhos e acaricia
o coração maltrapilho
transforma o mar em magia
e o pôr-do-sol em lembrança
de se guardar escondida
como amuleto da sorte
pra momentos difíceis
estado de amor
quando ocorre
faz a gente querer tudo
ser o tempo sempre curto
renova a esperança
quer hastear bandeira
gritar como maluco
: isso é que move o mundo!
estado de amor.
se não adianta falar
melhor o silêncio

mas não adianta calar
o inconsciente desvenda

estamos perdidos
só a verdade é saída

e é imprescindível
ter sangue frio

estar preparado
pra qualquer desafio

...
só a verdade impera

ainda quando reina
a mentira.
olhe pela janela
depois feche os olhos e só ouça
respire fundo o cheiro dela
esqueça a infância [as horas de ficar em casa sem poder ir pra rua]
se for pra voltar a ser criança
pense em bolinho de chuva
em filmes da sessão da tarde
mas se quiser o presente
sinta esse choro de alívio
deite-se em si mesmo, pacífico
e inspire essa poesia em gotas
que o planeta ainda emite.

adoro chuva
nós que somos diferentes, diferentes
que somos menos congruentes
somos ímpares de um par
nós que somos cromossomos de uma gênese
que somos o que fomos, o que virá
nós que somos os retratos na parede
que somos sonhos e serpente
que somos uva e maná
nós que somos medos e correntes
sonhamos asas e galáxias
(constelações imensas)

nós

que

somos

fomos

e

somente

seremos o que será.