Explicando um pouquinho:
A gente dorme em pousada,
Ou casa de morador.
A gente come na estrada
Ou onde houver uma sombra,
Um tiquim de água, um mijador.
Ou, todo matinho é banheiro,
Na hora do apuro.
Mas não se escandalize,
Que, apesar da poeira,
A gente é limpinho:
Leva sempre um saquinho.
Raça de peregrino:
De Tambaú à Aparecida.
Terço pendurado na mochila.
Dedos dos pés vermelhos, inchados,
Mas vale o trabalho:
É paz na cabeça, paisagem na lembrança
E, no encalço de Nossa Senhora,
O resgate da esperança.
E uma siriema atravessou calminha o caminho.
E um maluco-beleza,
Com sua bike-casa passou,
Com um cachorrinho.
Com ele, aprendemos mais uma:
O golpe do miojo:
Que enche o estômago do andarilho,
Que apela pro coração mole
De um que lhe acolhe.
Vários tipos de passarinhos,
Coloridos, brincalhões.
João de barro e a casinha bem feita,
Que fez pra sua passarinha.
E um toc-toc desconhecido:
É pica-pau que se mostra
E ‘avoa’ enquanto passo
Com enfoque pra seu penacho vermelho.
Que surpresa! do desenho direto pra meu roteiro.
Tem gente que faz de moto, todo equipado.
Tem gente que faz com alguém do lado,
Tem gente que faz sozinho,
Tem aquela que faz com o namorado,
E aquele que faz com a “patroa” na garupa.
Tem gente que faz com bicicleta
E tem gente que é só Deus na frente,
Nossa Senhora na curva.
Tem gente que faz pra agradecer,
Gente que o objetivo deturpa.
E gente que faz pela fé,
Pela saúde de alguém, ou pela sua.
Gente que faz pra pedir,
Ou apenas por amor à luta.
Em tudo tem um porquê,
Mas o sentido, na verdade,
É alcançar a imagem,
Beijar os pés da santa.
Tem gente que fala em vão
Seu nome sagrado.
Mas põe a mão no coração! –
Levantar em vão é pecado!
Tem lugar que simplesmente não passa carro
E um barulho de água ao longe, quase sempre.
Aqui pertinho de um barranco escorre...
De onde vem esta fonte?
Quando a subida é pesada, respira...
Que tem mais adiante.
Mas não se apoquente, siga.
É a Santa na frente.
A batida repica, o coração é na boca,
Mas entrega, então, em intenção,
Esse esforço imenso.
Deus é supremo e cuida
E tem uma setinha amarela por todo o caminho,
Que orienta o peregrino quando está perdido.
A setinha o guia, a fé aumenta.
Mas tem que fazer à vontade,
Que o objetivo não é chegar logo, mas ir.
Se rápido andares, perderás as paradas,
As grutinhas na estrada,
A chance de sentar um pouco
Num banquinho debaixo d’árvore.
Quando o que restar da subida
For maior que suas forças,
Pare e olhe pra baixo.
Aprecie de onde você está
O que você deixou pra trás.
E na hora em que o desânimo domina,
A esplêndida natureza te reanima,
Pois quanto mais alto o morro,
Mais a paisagem é bonita.
E na dificuldade maior,
A vista é quase miragem,
Ou como vista da aeronave.
Aproveite, então, a oportunidade,
Pra voar mais um pouco.
Estende a mão pra Ele,
Agradece, em sussuro, pra Ele ouvir,
Pois Ele está bem aí em cima.