domingo, 26 de julho de 2015

ondas

ondas
vêm e vão
surfam
calor
conexão
ondas
surgem/urgem
inclinam-se
(dramática
sedução)
conversas/convexas
não ditas
olhos de viés
mãos se embaralham
sem saber de quem são
e tocam
mais fundo
oceano escuro
naufrágio
: no casco do navio
vestígios
da matéria esquecida
quem precisa??

vontade de voar

uma viagem....
vontade de voar
de espargir no vento como pólen de flor
de evaporar no ar
como vapor de chaleira em noite fria


uma viagem
vontade de amar sem fim
de não acabar nunca
o êxtase daquele momento
em que dois tornam-se coisa una

plaino de asas meio abertas
observando o mundo num rasante
suAAAve
o vento defronte, vindo contra
mas o aroma, ah!, como é doce!

uma viagem
: sonho não ser
de um lugar só
transitar entre todas as coisas e povos
sem medo, sem signo

uma gaivotaAAA

sou bonita
ainda que com olhos meio tristes
ainda com este desejo de estar em tudo
não sendo nada
ser como uma brisa
ou o espírito da floresta

uma viagem, puxa
atravesso
horizontes
e canto
um canto novo
tenho n'alma este piado

uma melodia fina
e delicada
que às vezes soa um pouco triste
e bem por isso
e mais por isso
faz tudo mais bonito.
uma noite ela me chamou
vamos rezar
eu queria ser uma menina muito boa
rezar bem rezado
pra Deus se orgulhar de mim
mas o terço era longo
o pensamento vagava
e eu só via a chama da vela
em frente da imagem
e a voz grave daquela velha
puxando as Aves
: minha bruxinha de amor
(sinto saudade).


estou sempre me esquecendo

é preciso esquecer

talvez seja por isso que já não lembro

datas, nomes, dados, anos

no esforço de me esquecer muito
acabei esquecendo coisas
acabei esquecendo pontes, estradas
notícias, leis, teorias
...
acabei esquecendo os passos
não só as pegadas.

Tudo me protege

tenho que me separar um pouco
(aprendi a ser assim
ou sempre fui assim
já nem sei)
quem se aprofunda nas relações, não consegue flutuar por elas
como um beija-flor, paira
mas com grande esforço
é preciso bater as asas um zilhão de vezes pra estar sobre as coisas, sem tocá-las
muitas energias entrelaçando-se desesperadas
e não quereres que se encontram
disfarçados de querer
posso me desligar da vida que levo sem nenhum prejuízo
mas não posso perder o contato comigo, sem dor ou doença
aprendi a andar pelas ruas sem companhia
e sentir-me acompanhada do mundo, quando estou sozinha
aprendi a viajar devastando tudo
mas, principalmente, a deixar fluir ao acaso, os caminhos
e ver como Tudo me protege
e como as portas se abrem
e as estrelas se acendem
- músicas soam nas esquinas
e meninas brindam no forte sobre o mar -
de repente, me deixo e me encontro
sou eu quem dita o que será
(ao mesmo tempo que não
: tudo já está certo
o domínio das coisas é uma pretensão
aliada do caos, da confusão)
tenho sorte de poder andar muitos trajetos
calçadas de pedra ou de terra
repleta de mim mesma
...
lembro de ti
: sou também eu
um pouco de Deus.


se não adianta falar
melhor o silêncio

mas não adianta calar
o inconsciente desvenda


estamos perdidos
só a verdade é saída

e é imprescindível
ter sangue frio

estar preparado
pra qualquer desafio

...
só a verdade impera

ainda quando reina
a mentira.


olhe pela janela
depois feche os olhos e só ouça
respire fundo o cheiro dela
esqueça a infância [as horas de ficar em casa sem poder ir pra rua]
se for pra voltar a ser criança
pense em bolinho de chuva
em filmes da sessão da tarde
mas se quiser o presente
sinta esse choro de alívio
deite-se em si mesmo, pacífico
e inspire essa poesia em gotas
que o planeta ainda emite.


adoro chuva


toda quarta-feira chove

nas entranhas do meu estranhamento

o sol fica cinza e se derrama (cataclisma)

nas antíteses dessas frases (fase-enigma)

toda quarta-feira chove.

presságio



conviver com o medo
todo momento
fingir pra si mesmo
a coragem


não escuto
mesmo assim gritam
as evidências
os presságios

de que tudo seja um momento
volátil
de que na verdade não exista
felicidade

de que o desapego seja urgente
inda que arda
o desejo
de que o agora seja sempre

de que o pra sempre
seja fato.

coisas que eu não sei

começam a borbulhar
coisas que eu não sei
coisas que fervem
bolhas bolhas bolhas
que sobem e descem
do diafragma à garganta
e fervem fervem fervem
sem evaporar
: estão ali as palavras
duras e cruas
cozinhando na percepção
até que estejam 'al dente'
e saltem vivas como seres
independentes
(em ebulição).

uma vez, o inteiro; para sempre, o inteiro

é preciso burilar as palavras
investigar a si mesmo
(imprescindível memória
inescusável sentimento)
...
é preciso estar em silêncio
não se apartar da estrada
é preciso seguir, ir embora
ficar dentro estando fora
não ter medo, tendo medo
...
é preciso ensaiar os dias
e as falas
sem esquecer da tristeza
sabendo que tudo o que é hoje
amanhã passa
seja bom, ou seja menos
...
mas depois que se apresenta
por um instante, o inteiro
pra sempre fica a lembrança
do pouco que vale a pena
do muito que nos sustenta
...
é preciso estar atento
(vida adentro)
estar onde esteja apenas
mas não esquecer
(nem um momento)
do inteiro, uma vez, o inteiro.

desaparecer



desaparecer
para onde?
pra dentro do ser
e assim escrever
sem uma sílaba
sem um símbolo
sinal de vida
legenda
fotografia


desaparecer
pra encontrar o início
reencontrar
-se
como no cheiro de um livro
num tempo perdido
aquele muro baixo
da casa, um dia

desaparecendo
(especialista)
na arte de sumir
de nada ser
evaporar no ar
se perder
entre os elementos químicos
, uma vírgula.


(ando sumida,
quem se importa?)

feriado aos dias de chuva

decrete-se feriado aos dias de chuva!

a chuva é tão linda de ouvir, quieta
enrolada na coberta, como uma criança
pensando nas plantas que crescem
na flor que dança
nos passarinhos resignados ao banho...
- feriado aos dias de chuva!
quando ouvem-se melhor os pensamentos
(os pingos de chuva
são versos perfeitos).

ser forte

ser forte
sendo forte
e ponto.
sem meio
só extremo
não cedo.
pra aguentar
o tranco
fecho o punho
sem medo.
pra ser forte
me fecho
e sou forte
apenas.
não penso
e vou
mais um instante
mais um instante
mais um instante.